10/13/2008

As rendas de casa

Anda por aí um grande escândalo sobre as baixas rendas de casa praticadas pela autarquia de Lisboa, distribuídas a gente necessitada e a outra gente menos necessitada mas que é ou foi amiga dos diversos responsáveis autárquicos.

No entanto, convém dizer que, olhando para o parque habitacional de Lisboa e ao mercado de arrendamento, os preços das casas das autarquias não fogem ao padrão. Com efeito, segundo os Censos de 2001, dos cerca de 108 mil fogos alugados na capital, 71% pagavam menos de 100 euros de renda mensal e um em cada quatro (25%) pagavam mesmo menos de 25 euros.

Há, contudo, uma diferença substancial: no caso das casas da autarquia, as rendas são de favor; nos outros casos deve-se ao congelamento das rendas. Mas em ambos os casos resultam num mesmo mar de problema: a degradação do parque habitacional de Lisboa (pois rendas baixas não dão para pagar reabilitações) e no desvirtuamento do mercado habitacional. Tudo o que é caso que «consegue» sair do espartilho da antiga lei do arrendamento, coloca rendas elevadas. E aquilo que a autarquia deveria fazer com as suas milhares de casas a preços mais elevados do que as casas sujeitas a rendas condicionadas, mas mais baixas do que os valores praticados no mercado livre de aluguer, de modo a fazer baixar os preços daquelas. Como não faz isso - e deveria fazer -, a autarquia além de favorecer os amigos peca gravemente por omissão numa matéria de crucial importância para a cidade.

Na hora da verdade...

... é isto que acontece. Nos momentos de crise financeira, as grandes indústrias acenam sempre com a questão dos empregos para não cumprirem as obrigações ambientais. Se a proposta de os sectores industriais mais poluentes deixarem de ser obrigados ao pagamento de direitos de emissões de CO2 for aceite pela Comissão Europeia, podem fazer o funeral ao Protocolo de Quioto. Ou então quem vai pagar isto tudo são aqueles que também pagarão os dislates das instituições bancárias: ou seja, o contribuinte.

10/06/2008

Benza-o Deus

João César das Neves escreve hoje sobre os casamentos de homossexuais no Diário de Notícias. Zurze forte e feio contra os seus defensores. Isto pouco me interessa pessoalmente, mas há uma passagem sublime. O dito professor não quer que o julguem intolerante, pelo contrário, e daí diz que sempre «é possível discordar fortemente da orientação de alguém, tratando-o com respeito e consideração», acrescentando que «é isso a democracia e é assim que somos chamados a lidar com fumadores, racistas, poluidores».

Portanto, se bem entendi, João César das Neves advoga que devemos discordar fortemente dos homossexuais, dos fumadores, dos racistas e dos poluidores. Todos estes, para ele, estão na mesma gamela... mas devem ser tratados com respeitinho e muita consideração. O facto de apenas os racistas e poluidores poderem estar sob a alçada do Código Penal são meros pormenores,portanto.

10/01/2008

Onde estava no dia em que recebeu a sua casinha?

À luz do escândalo Lisboagate - nu e lodoso retrato do burgo -, esta entrevista de Baptista-Bastos ao Jornal de Notícias no Verão do ano passado torna-se deliciosa, ironica e pungentemente deliciosa.

Primeiro, porque foi feita ao telefone a partir da sua casa de Constância - sim, aquela que ele comprou logo a seguir a «receber» a casinha da autarquia de Lisboa por razões económicas.

Segundo, porque mostra um Baptista-Bastos esquecido (ele que tentava obrigar sempre os seus entrevistados a relembrarem onde estavam antes do 25 de Abril) ou então ingrato. A páginas tantas, diz ele o seguinte: «Eu tenho três filhos formados e vi-me à nora para os licenciar. Tive que abdicar de muitas coisas. Ninguém nos ajudou». A não ser a câmara de Lisboa com uma casinha - coisa pouca, irrelevante, portanto...

Terceiro, porque mostra uma estranha forma de aplicar os ensinamentos dos mestres que se orgulha de ter conhecido. Disse ele, naquela entrevista a seguinte pérola: «Ainda ontem estive a terminar um texto sobre Aquilino Ribeiro. Eu conheci-o. Ele gostava muito de mim. Foi essa gente que formou o homem que eu sou. Gente que tinha o conceito da ética, da moral, da deontologia, e que a aplicava a todos os sistemas de vida».

Pela boca morre o peixe, portanto. E a aura de alguém que se colocava sempre num lugar de superioridade moral perante os outros. O que não era criticável, não fosse ter ele telhados de vidro sob a forma de casinha recebida por meios que, além de serem de duvidosa legalidade, são de certa imoralidade.