4/28/2007

Um servicinho bem feito, sim senhor

Sobre a decisão do Governo em deixar de ratificar os instrumentos de planeamento local e, portanto, deixar ao livre arbítrio dos autarcas o ordenamento urbanístico do território há muito para dizer - e direi a seu tempo -, mas quero, desde já, destacar algo que mostra bem o estado da informação manipulada pelo Estado. Para defender o indefensável (e tentar mostrar ao povo que estamos perante uma boa coisa), a Lusa fez um servicinho ao Governo: foi falar apenas - e repito, apenas - com Sidónio Pardal (e por será, hein, hein?!), sempre muito liberal nestas coisas, para defender a medida do Governo. A notícia da Lusa, que foi depois transmitida por outros órgãos de comunicação social (como o Público), é um must de parvoíces. Entre muitas, destaco as seguintes passagens:

«Para Sidónio Pardal, "é importante aumentar a responsabilidade política e limitar o poder burocrático de funcionários anónimos que actuam de forma quase arbitrária no planeamento do território". "Os técnicos do Instituto de Conservação da Natureza e das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional têm poder de decidir sobre a economia do território, quando são as autarquias, assembleias municipais e os governantes que são os órgãos de decisão", criticou».

(...)

«Outro caso é da Reserva Ecológica Nacional, que Sidónio Pardal considera "uma fraude" porque não identifica ecossistemas, impõe o estado de abandono e exerce o poder impróprio de dar e sonegar mais-valias. Ou a Reserva Agrícola Nacional, definida como "uma ilusão" porque "convence que ao serem demarcados retalhos de solos de alta fertilidade, o espaço agrícola fica ordenado"».

Voltarei ao assunto, claro. E também aos prazos de 60 a 120 dias para a aprovação dos famigerados Projectos de Interesse Nacional (PIN).

4/24/2007

A culpa que morre solteira

Li há dias - e esqueci-me entretanto de aqui referir - que o Ministério Público decidiu arquivar o processo aberto após o incêndio de Julho do ano passado na zona da Guarda que causou a morte de vários bombeiros, a maior parte dos quais chilenos. Neste caso, apurou-se a causa e o autor. Ficou, contudo, tudo em águas de bacalhau. Não houve intenção, logo foi um acidente, logo arquive-se. Eis o país dos brandos costumes e da morte que morre solteira. Depois queixem-se...

P.S. No caso dos incêndios, continuo a defender que alguns comportamentos de negligência grosseira - como seja andar com maquinaria sem protecção de faíscas em zonas de risco e com tempo quente e seco - sejam equiparados, para efeitos penais, ao dolo (intencionalidade).

4/22/2007

O nojo

Leio no site do Clube de Jornalistas, que João Morgado Fernandes, antigo director-adjunto do Diário de Notícias, entrou agora em funções de assessor de imprensa do ministro das Obras Públicas, Mário Lino. Eis o merecido prémio para quem, no seu consulado na direcção do Diário de Notícias, se empenhava afanosa e despudoradamente em loas ao Governo. E que não se importou em fazer a filhaputice de me tramar no caso Instituto da Água. Esta notícia acaba por não me surpreender - os amigos pagam e recebem favores -, mas chateia-me apenas por uma coisa: enquanto ele trabalhava no Diário de Notícias, o salário era pago pelo empresário Joaquim Oliveira; agora, é por nós, contribuintes.

4/21/2007

Investimentos a que custos?

Que investimentos, como os do IKEA em Paços de Ferreira, são importantes para o país, não merecem discussão - embora convenha relativizar a euforia do Governo, pois estamos a falar de investimento estrangeiro, pelo que a maioria das mais-valias não ficam em Portugal. Porém, já merece discussão - e crítica - e postura deste Governo quando autoriza um parque industrial ao arrepio dos instrumentos de ordenamento do território e do ambiente. A questão essencial não é - e não parece que seja essa a postura da Quercus - de uma qualquer oposição contra investimentos, mas sim saber se o Governo de Portugal terá capacidade de captar investimentos sem se comportar como um país do Terceiro Mundo - ou seja, sem arranjar expedientes de excepção para agradar aos empresários. É que, se assim for, abrem-se precedentes graves. Por um lado, o poder do dinheiro acaba por criar a sua própria lei; por outro, apenas começam a surgir investimentos em Portugal que não são aceites noutros países.

4/19/2007

Mais uma achega

Estou farto da questão da Universidade Independente. Por mim, José Sócrates sempre foi engenheiro - e assim sempre o tratei desde que o conheci em 1995. Por mim, José Sócrates acabou a licenciatura na Universidade Independente, independentemente do favorecimento e facilidades que lhe foram concedidas - e que, ninguém duvide, foram extensíveis a muitos outros. Por mim, o essencial neste assunto é aprofundar as ligações entre António Morais (seu professor) e os negócios associados ao Governo PS de António Guterres. E sobretudo as suas relações com o triângulo Sócrates-Vara-Edite Estrela. E quase só tenho visto o Público a fazer esse trabalho. O resto já é fait divers.

Os jotinhas

As juventudes partidárias não se entenderam para saber quem era o jovem que deveria discursar nas comemorações do 25 de Abril. As organizações ligadas ao PC boicotaram, dizem os jornais, a nome de Ricardo Araújo Pereira, por sinal ex-militante, e depois entraram em discussões pueris sem chegarem a consenso. Este caso não é apenas ridículo - é grave porque são estes jotinhas que vamos apanhar no futuro a (des)governarem-nos.
Os ricos anos da corrupção

Este caso, relatado aqui pelo DN, sobre a condenação por corrupção da máquina fiscal sabe a pouco. Sobretudo quando, no final do texto, se diz o seguinte: «O produto do suborno era repartido pelos funcionários dos fisco e outros agentes envolvidos na cadeia de corrupção. Em 2003, em entrevista ao Correio da Manhã, Rui Canas [condenado neste processo a 10 anos de prisão] afirmou: '80 por cento dos funcionários de Finanças que conheci até 2002 continuam a fazer corrupção. Estou a falar, essencialmente, de directores e liquidadores tributários que pagam a esses directores para fazerem corrupção.' Na mesma altura garantiu que só durante o período do cavaquismo terá ganho mais de dois milhões de euros».

4/13/2007

Uma questão nuclear

O Presidente da República teria feito melhor serviço ao pais se, em vez de dizer que o nuclear terá de ser debatido em Portugal (vd. aqui), propusesse - e promovesse - um debate para tentar compreender por que razão em Portugal os consumos energéticos continuam, há anos, sucessivamente a ser superiores aos crescimento económico...

Em Portugal, a energia nuclear é uma ideia obtusa em termos financeiros e energéticos - e nem meto aqui a questão da segurança e do ambiente -, pois Portugal tem potência instalada mais do que suficiente (e, portanto, a energia nuclear somente serviria para exportação... sem grande interesse público face às desvantagens). Além disso, não soluciona nada em termos energéticos, sabendo que somente produz electricidade. E a electricidade representa apenas cerca de 6% do total da energia consumida em Portugal.
Umas pequenas achegas

Assisto - meio divertido, meio desconsolado - à novela Unigate e às trapalhadas em torno do curso da Engenharia Civil do primeiro-ministro. Já muito se disse sobre o assunto, apenas acrescento duas questões:

a) Talvez seja dos jornalistas portugueses que melhor conheceu José Sócrates no seu início das suas lides governamentais. E posso assegurar que qualquer semelhança entre José Sócrates versão 1995 e José Sócrates versão 2007 é pura coincidência. Donde, provavelmente José Sócrates versão 2007 estará agora a lamentar-se das atitudes do José Sócrates versão 1995.

b) Sobre as pressões exercidas pelo gabinete do primeiro-ministro, pelo que leio parecem-me coisas de pormenor. Pressões de assessorias de imprensa conheço-as bem. Por exemplo, há anos, uma «exigiu-me» que lhe divulgasse uma fonte, caso contrário o ministro (quem seria?) não falaria mais comigo. A minha resposta, claro, imagina-se qual terá sido. Resultado: durante cerca de dois anos, o tal ministro (quem seria?) não me prestou quaisquer declarações sempre que as tentava obter...

4/03/2007

Diz o roto ao nu: por que não te vestes tu?

Isto dá-me uma certa vontade de rir. Mas um riso amarelo. Porque, na verdade, tanto um Governo PSD como um Governo PS se comporta da mesma forma. E actuam de maneira tentacular. Eu sofri - e convenhamos que ainda sofro - disso. Mas mais do que culpar as pressões das assessorias de imprensa dos ministros - que me parecem legítimas por funcionarem como um «lobby» -, a questão deve colocar-se ao nível dos próprios jornalistas e das direcções dos jornais. São os jornalistas que devem demonstrar seriedade, porque o seu «contrato» de seriedade não é com os patrões (como acontece com os assessores de imprensa governamentais), mas sim com os leitores. E já se sabe que, por vezes, a carne (de alguns) é fraca...

4/02/2007

Já não há paciência...

A novela da co-incineração iniciou-se, se se recordam, em 1996 logo no início do primeiro Governo de António Guterres. Nessa altura, José Sócrates era o secretário de Estado-adjunto do Ambiente e foi o responsável por revogar a decisão do anterior Governo de Cavaco Silva que tinha decidido construir em Estarreja uma central de incineração dedicada. Para quem se recorda - que devem ser poucos -, Sócrates alegava que o processo da co-incineração se instalaria mais rapidamente e era mais seguro.

Mais de 10 anos depois, estamos quase na estaca zero. A culpa tem sido da obstinação política de Sócrates sobre esta matéria. De facto, pode ele ter razão, pode até ser irrelevante a poluição causada pela co-incineração (e é, se comparada com as centrais de incineração de lixos da Valorsul e da Lipor, e também da «fornalha» do hospital Júlio de Matos), mas isso não deveria significar que um Governo imponha uma solução ao arrepio da legislação.

O actual Governo, em funções há dois anos, sabia que os estudos de impacte ambiental estavam legalmente caducados. Deveria, por isso, iniciar novos estudos e seguir os trâmites legais. Se assim se fizesse, há muito o processo estaria concluído. Teimoso, Sócrates não quis. Avanço com um já famoso «interesse público», expediente cada vez mais em voga pelo Governo sempre que deseja contornar a lei. Saiu-lhe, contudo, o tiro pela culatra, vendo os tribunais sucessivamente a negar-lhe razão (mais uma derrota, como se vê aqui). E como mau perdedor - o que num Governo democrático é mau princípio - insiste via jurídica. Quando, na verdade, deveria era gastar os seus esforços e o nosso dinheiro a estudar e a implementar um sistema que, efectivamente, desse garantias de segurança às populações. Isso, sim, é interesse público.