7/29/2005
7/27/2005
Eu sei que neste tipo de encontros, os políticos têm de ser diplomáticos, mas espero que tenha sido esse o caso das declarações do ministro do Ambiente, Nunes Correia, ao pedido da sua homóloga espanhola para que Portugal ceda água à Extremadura através da albufeira de Alqueva. Nunes Correia, segundo a imprensa, disse que «ttemos disponibilidade para entregar a água necessária, mas essa questão ainda tem de ser trabalhada do ponto de vista técnico».
De facto, na verdade, a «questão» tem sim de ser «trabalhada» do ponto de vista político, porque Portugal necessita urgentemente de garantir algumas reformulações no convénio luso-espanhol dos recursos hídricos que começam sobretudo pela definição de um caudal mínimo e de volumes mensais de escoamento. E também de uma rectificação no ponto de controlo no caso do rio Tejo (a barragem de Cedillo é alimentada também por cursos de água portugueses e, por isso, não é um bom indicador das afluências espanholas ao território nacional).
Por outro lado, Portugal pode meter-se, com esta cedência, numa camisa de sete varas. Como parece evidente que o Governo português tudo fará para «subsidiar» a água aos agricultores nacionais, das duas uma: ou vende a água a Espanha ao preço da chuva ou vende mais cara e acaba por ser acusado de estar a fazer concorrência desleal...
Por fim, esta cedência de água do Alqueva para a agricultura espanhola vai acabar por ser mais um sinal da inépcia do Plano de Rega do Alentejo (do elefante branco já esperado). Quase apostaria que os primeiros agricultores a regarem directamente da água proveniente da albufeira de Alqueva vão mesmo ser os espanhóis. E, aliás, mesmo em território nacional, é sabido que muitas herdades são já de espanhóis. Afinal, para o Governo e os empresários portugueses, basta a água para regar campos de golfe e construir empreendimentos turísticos à beira da albufeira. Ou seja, os dinheiros públicos a servirem para criar mais-valias aos interesses privados...
7/24/2005
Quando hoje na televisão assisti ao Presidente da República elogiar os bombeiros voluntários pelo trabalho no combate aos incêndios florestais, surgiu-me na cabeça uma analogia: o discurso de um presidente de um clube de terceira divisão que elogia os seus jogadores amadores (que não têm tempo para treinar e aprender tácticas) por terem dado o litro dentro do campo, apesar da copiosa derrota.
Aquilo que pretendo dizer com isto é o seguinte: longe de mim responsabilizar os bombeiros voluntários pela situação catastrófica dos incêndios florestais. Não são eles os responsáveis pela má gestão da floresta, não são eles que os põem e estão - como bombeiros - a apanhar com as consequências de um conjunto vasto de irresponsabilidades que grassam no país. Não é a eles que se deve apontar responsabilidades: eles fazem o que podem; a maioria tem a sua profissão, tem um indiscutível mérito de «sacrifício», ou seja, fazem o que podem.
Mas o problema é exactamente este: a salvaguarda da floresta - riqueza ecológica, paisagística e económica do país - não pode estar à mercê de abnegados voluntaristas que «fazem o que podem». Preferia abnegados «mercenários» que «fazem o que devem». Isto é, preferia profissionais - a ganharem bem, a serem bem treinados e equipados, a poderem ser responsabilizados e a serem elogiados - não por serem voluntariosos, mas sim por serem eficazes e eficientes no combate às chamas.
A questão essencial será - fazendo uma comparação futeboleira - em poupar e ter uma equipa de bons rapazes e baratinha mas que é goleada ou ter uma equipa de bons rapazes e cara mas que vence. É que, ao contrário do futebol, ter uma equipa baratinha na defesa da floresta acaba por custar mais do que apostar numa equipa cara...
Tudo isto para defender que enquanto não deixarmos de apostar em bombeiros voluntários sem treino e os substituirmos (ou adaptá-los) em bombeiros profissionais (com treino e conhecimentos de combate), os elogios do Presidente da República continuarão ano após ano a coinciderem com uma floresta cada vez mais calcinada.
7/21/2005
Acho que esta semana vou jogar no Euromilhões! No dia 15 de Junho, escrevia o seguinte no Farpas Verdes CCXLI:
«Continuamos a não aprender nada na estratégia de combate aos fogos florestais. Em vez de helicópteros de transporte de brigadas de primeira intervenção para atacar os focos de raiz, continuamos a apostar em helicópteros que despejam baldes de água em fogos já bem alimentados. E logo 22...
E, aliás, uma análise rápida, sugere-me que a factura final será, por certo, muito superior à anunciada (9.439.451,28 euros). Isto porque para tantos helicópteros (22) e tão poucas horas (2550) , das duas uma: ou se irá pagar chorudas horas extraordinárias ou receio que nem se chegue a Agosto.
Basta fazer umas simples contas: em média, cada helicóptero voará cerca de 116 horas; se se considerar apenas que irão estar disponíveis durante Julho, Agosto e Setembro, temos 92 dias. Contas feitas, dá uma hora e um quarto de voo por dia para cada helicóptero. Parece-me pouco, sobretudo porque com tantos helicópteros a tentação dos comandantes dos bombeiros (e das populações) é exigir um em qualquer fogo».
Pois bem, acabo agora de ouvir na SIC Notícias, o ministro António Costa lamentar que já estavam quase esgotadas as horas de voo do tal contrato de 9.439.451,28 euros (nove milhões, quatrocentos e trinta e nove mil, quatrocentos e cinquenta e um euros e vinte e oito cêntimos) e que, por isso, teriam de prolongar o contrato. Ou seja, eu disse que as horas de voo não iam chegar até Agosto e, de facto, hoje estamos a 21 de Julho, faltando ainda cerca de dois meses de «inferno».
Já se estava a ver o que este rigor escondia: uma má programação e gestão das necessidades dos meios aéreos. Preparem os bolsos para a factura das horas extraordinárias...
Existem tiques que jamais acabam. O Ministério do Ambiente - ai ilusão, ilusão! - não se lembra de mais nada para sensibilizar a população para poupar água do que fazer uma «inundante» campanha de publicidade - «softzita», com uma mensagem tipo «escola primária» -, em vez de tomar medidas sérias e com efeitos.
A água é um bem de primeira necessidade, mas acima de tudo um bem económico. Aquilo que deveria ver-se era um esforço para diminuir os despedícios das autarquias e empresas gestoras - então chateiam-se com o gotejar de uma torneira e os distribuidores desperdiçam 30 e 40% da água que captam antes de a conseguir vender?
Por outro lado, há uma forma mais eficaz e sem custos - pelo contrário, com vantagens económicas - para diminuir os consumos supérfluos. Façam um aumento de 10% ou 20% na água para consumo durante o Verão, justificando-o com a situação de seca. Vale por mil campanhas. O efeito psicológico desse aparentemente aumento elevado seria imediato na poupança. E, na realidade, seria feito de modo artificoso, pois na realidade nem sequer beliscaria a inflação.
Aliás, basta ver um exemplo: se consideramos que 1 metro cúbico de água custa 50 cêntimos (e muito poucos concelhos atingem este valor) e que cada pessoa consome 200 litros de água por dia (valor típico de uma cidade, o que daria 6 metros cúbicos por pessoa em cada mês), significa que um acréscimo de 20% faria com que, no final do mês, per capita se passaria a pagar pagar-se-ia 3,6 euros em vez de 3,0 euros. Isto é apenas 0,6 euros, o que é menos do que uma garrafa de 0,25 litros de água do Luso.
Por outro lado, se acompanhada com uma correcta mensagem comunicacional, dir-se-ia às pessoas o seguinte: pague o mesmo, consumindo melhor... E num país com sentido de gestão dos recursos hídricos, até se poderia ser mais criativo: para os clientes que tivessem conseguido poupar mais do que 20% comparativamente ao mês homólogo do ano anterior, o preço por metro cúbico mantinha-se inalterável. Mas isto, se calhar, já é pedir muito...
Ao invés, com este tipo de campanhas de poupança de água - que não dão trabalho e descansam as consciências políticas - somente se gasta dinheiro e somente as pessoas começarão a poupar quando, efectivamente, deixarem de ver água a correr das torneiras.
O negócio Parque Mayer-Feira Popular é o paradigma (em ponto grande) das negociatas e das relações perigosas e obscuras entre empresas imobiliárias e políticos. Onde pára o Ministério Públicos?! Para quando uma «operação betoneira» para tirar a limpo este e muitos outros casos de um país que só sabe criar (concentrar) riqueza no sector do imobiliário à custa da degradação da qualidade de vida e do abuso na gestão dos bens públicos?
Estava a continuar a edição de textos e deparei-me com esta «pérola» de proposta de Governo em 1926. Ainda ponderei se haveria de aqui colocá-la. Nunca se sabe, nunca se sabe... Tal como com o «elefante TGV branco», o nosso Governo ainda se lembra, alegando a seca, de fazer isto:
«Lisboa e Vila Real de Santo António vão ser ligadas por meio de um canal fluvial, aberto entre os rios Tejo, Sado e Guadiana», in O Século (19 de Março de 1926)
Artigo que refere ter o ministro da Marinha, Pereira da Silva, tomado a «utilíssima iniciativa» de mandar estudar e implantar as obras necessárias para fazer as obras necessárias para ligar os rios Tejo, Guadiana e Sado. O artigo salienta que como já foram elaborados os planos preliminares, com a direcção do comandante Filipe de Carvalho, «é de supor que em breve» estas obras serão executadas. O artigo apresenta um esboço do empreendimento e uma entrevista com o ministro da Marinha.
7/19/2005
Eu não gosto de fazer o papel de «estraga-festas», mas o clima de euforia com que o Governo apresenta o programa de promoção da energia eólica parece-me desmesurado. O primeiro-ministro disse que com isto Portugal reduzirá «a sua excessiva dependência do gás e do petróleo, o que, em consequência, permitirá reduzir as nossas importações e melhorar o nosso equilíbrio macroeconómico».
Sejamos claros: caso o Governo consiga mesmo implantar 2500 MW de eólica, o acréscimo de electricidade por esta via não conseguirá sequer para «tapar» a taxa de crescimento dos consumos por ano. Com efeito, basta fazer o seguinte exercício:
a) em 2004, os 616 MW de eólica produziram 787 GWh de electricidade, ou seja, 1,3 GWh/MW.
Convém, aliás, desmistificar um "pormenor" importante: 1 MW de potência instalada significa diferente «quantidade» de electricidade. Por exemplo, raramente se conseguirá em Portugal que 1 MW de eólica produza mais do que 1,5 GWh. No caso da hidroelectricidade, em ano hidrológico médio, 1 MW produz 3,1 GWh (o ano passado, que teve um coeficiente de hidraulicidade bastante baixo - 0,66 - 1 MW «deu» 2,2 GWh), enquanto 1 MW de térmica atinge mais de 4 GWh (não estou a fazer a apologia de nenhuma, mas somente a fazer alguns considerandos, até porque, tecnicamente, a eólica jamais «substituirá» a térmica, como já referi em anterior post, antes sim pode ser um bom complemento à hídrica).
b) caso até 2010 sejam instalados novos 2500 MW de eólica até 2010 (visão muito optimista), significa que (vamos ser optimistas e assumir que 1 MW produzirá 1,5 GWh), teremos então um acréscimo de produção de 3750 GWh.
c) a evolução do consumo de electricidade em Portugal nos últimos anos tem sido a seguinte:
2001 - 40015 GWh
2002 - 40664 GWh (crescimento de 649 GWh, + 1,6%)
2003 - 43061 GWh (crescimento de 2397 GWh, + 7,2%)
2004 - 45500 GWh (crescimento de 2439 GWh, +5,7%)
isto significa entre 2001 e 2004 (3 anos) que houve um crescimento de 5485 GWh (+13,7%)
d) Conclusão: se em 3 anos aumentámos os consumos eléctricos em 5485 GWh, significa que mesmo sendo optimista - assumindo como refiro em b) que a eólica cresce 3750 GWh em apenas 5 anos -,fácil é de ver que, a manter-se esta taxa de crescimento dos consumos, teremos que aumentar à mesma a importação de carvão e gás natural.
Em suma, se nada se fizer para melhorar a (in)eficiência energética do país - e isso consegue-se crescendo mais e consumindo melhor (e não crescendo pouco e consumindo pior...) -, este programa do Governo nada mais conseguirá que espalhar «ventoinhas» pelas serranias de Portugal, empobrecendo-o ainda mais em termos ambientais e paisagísticos. E, ao contrário do que o primeiro-ministro José Sócrates diz, não «representa um dos pontos de encontro entre a economia e o ambiente», nem «servirá para dinamizar a economia», nem «para dar a Portugal um paradigma de desenvolvimento sustentável e amigo do ambiente».
P.S. Haverei de voltar a abordar, em breve, esta questão sob outra perspectiva (sob a questão ambiental e de planeamento territorial e energético)...
7/17/2005
Aviso que hoje é dia 17 de Julho e não dia 1 de Abril. Ou então o presidente da Comissão Europeia não foi governante português nem primeiro-ministro de Portugal. Enfim, bem prega frei Durão "Tomás" Barroso...
Durão Barroso pede à China mais eficácia na utilização da energia
16.07.2005 - 20h07 Lusa
O presidente da Comissão Europeia (CE), José Manuel Durão Barroso, elogiou em Xangai o rápido crescimento económico da China e pediu ao país para tornar mais eficaz a utilização da energia.
7/14/2005
Ontem à noite na SIC Notícias foi congrangedor assistir à entrevista feita ao general Ferreira do Amaral, presidente da Autoridade Nacional para os Incêndios Florestais. Julgo que em tempos, defendi aqui que a questão do combate aos fogos florestais tem muito de táctica militar e que, por isso, via com agrado a escolha de um militar para um cargo deste género.
Contudo, lá diz o ditado popular, o hábito não faz o monge. E, de facto, foi notório que o general Ferreira do Amaral não possui estofo para este cargo. Com um discurso de pedagogia bacoca começou por quase «culpar» a comunicação social de dar destaque aos fogos mostrando as frentes de fogo (os media fazem o seu papel), depois veio o pior. Disse ele, mais ou menos por estas palavras, que o combate era eficiente, porque «somente cerca de 5% dos incêndios não eram apagados nas primeiras horas» e que - pasme-se - «ainda não houve nenhum fogo que tenha deixado de ser extinto»!!!
Em relação aos métodos de combate dos incêndios e aos número de bombeiros mortos e feridos, diz que se deveu à «abnegação» no combate, elogiando, mais uma vez, o voluntarismo. Enquanto continuarmos a tapar o sol com a peneira não vamos lá. As imagens que as televisões mostram é bombeiros a atacarem frentes de fogo demasiado forte sem que qualquer efeito tenham os esguichos de água; grupos de bombeiros a aguardarem que a frente de fogo chegue às estradas sem, por exemplo, fazerem cortes de vegetação para criarem um «corta-fogo» - nunca vi moto-serras e outros materiais em função como vi no ano passado na Andaluzia -; e bombeiros a serem surpreendidos pelo chamado «efeito de chaminé» e a colocarem em risco a sua vida (confunde-se abnegação com negligência e impreparação). Enfim, Portugal no seu pior...
Viva a memória, viva este país vergado ao betão e ao automóvel e que arrasa tudo o que tenha uma corzita verde. Eis o paradigma do século XXI da República de Portugal e dos Algarves. Um dia destes algum autarca ainda há-de lembrar-se de construir um «arvoreto».
Retirado do Público (13/7/2004)
«O antigo Jardim Charles Bonnet, em Loulé, vai dar lugar a um loteamento urbanístico. O anteprojecto, aprovado por unanimidade na última reunião de câmara, prevê, como contrapartida, a cedência ao município de duas centenas de lugares para parqueamento automóvel. (...) O terreno em causa, com 1,5 hectares, foi local de residência de Charles Bonnet, responsável pelos primeiros trabalhos consistentes de investigação sobre a geologia, a geografia e a história natural do Algarve. (...) O presidente da câmara adianta que na praça central, em volta da qual serão construídos os prédios, "será erguido um equipamento público, evocativo da memória do investigador".» (e eu acrescento... que deve revirar-se na tumba)
Sobre este assunto, veja-se a crónica do Professor Miguel Ramalho no Expresso Online.
7/12/2005
Que dizer de um país onde, num período de seca, a localidade onde existe uma das principais fontes de água mineral tem de ser abastecida por auto-tanques dos bombeiros? Eu não queria acreditar, mas o último relatório do Instituto da Água diz ser esta a situação do Luso, no concelho da Mealhada, em plena serra do Buçaco.
Não me parece que seja apenas por falta de chuva que esta situação está a ocorrer...
No ano passado, o então Governo PSD-PP criou um Fundo Florestal Permanente, cujo financiamento advinha de uma espécie de «eco-taxa» obtusa proveniente da gasolina sem chumbo e do gasóleo marcado. Pelas contas que fiz dos consumos destes combustíveis em 2004, com esta «ecotaxa» ter-se-á recolhido cerca de 14 milhões de euros (2,8 milhões de contos, a valores antigos). Desconheço para onde se esfumaram estas verbas, tanto mais que pouco se sabe aquilo que anda fazendo a A gência para a Prevenção de Incêndios Florestais
Ontem, surge a notícia do actual Governo estar a pensar criar um Fundo Imobiliário Florestal - que deverá ser tão-somente uma mudança na denominação, que nisto os políticos têm horror de herdarem os nomes de entidades criadas pelos seus antecessores - em que se se estabelece uma dotação de 20 milhões de euros. Desconhece-se, em todo o caso, qual a origem desta dotação (Orçamento de Estado? Ecotaxa? E será que esse valor é mesmo garantido?).
O ministro Jaime Silva também prometeu mais dois Planos Nacionais: uma da Floresta e outra de Defesa da Floresta Contra Incêndios , mas mostra-se logo pouco ambicioso, quando se fica logo a saber que não haverá nem incentivos fiscais nem penalizações aos proprietários florestais em função da gestão que fazem.
Na minha opinião, não vale a pena fazer planos, prometer verbas, caso não haja coragem política para inverter o modus operandi da gestão florestal do país. E isso apenas se consegue com medidas estruturais que penalizem quem faz má gestão e beneficie quem faz boa gestão. No sector florestal - como em muitos outros - as boas intenções e os sucessivos planos não têm resultado. E não me parece que com esta política, o actual Ministério da Agricultura consiga melhorar a situação.
7/11/2005
Muito boa a entrevista emitida ontem na SIC Notícias (repetida hoje às 13 horas) a José Sá Fernandes (programa Outras Conversas, de Maria João Avillez). O candidato independente à autarquia de Lisboa - que eu apoio, como aqui já manifestei - soube explicar muito bem como a sua independência se mantém mesmo tendo o apoio do Bloco de Esquerda. Soube também mostrar - apesar da incredulidade da entrevistadora - como tão diversificados apoios ideológicos - que vão desde o BE até Ribeiro Telles, passando por António Barreto e muitos outras pessoas de diversos quadrantes - é uma mais-valia que demonstra a força e abrangência de um projecto.
Nos aspectos técnicos, Sá Fernandes soube ter a lição bem estudada, com as ideias muitíssimo bem arrumadas e consegui demonstrar - perante a incredulidade de Maria Joao Avillez - como algumas medidas que poderiam ser consideradas «folclóricas» (a entrevistadora bem tentou dar-lhe essa conotação, mesmo se a intenção era a de fazer o legítimo papel de «advogado do diabo») são, na verdade, essenciais para o futuro da cidade. Foram, por exemplo, o caso da defesa das hortas sociais, do parque periférico, das árvores por cada nascimento, da supressão do tráfego das laterais da Avenida da Liberdade para um passeio público, etc..
Marcou também pontos ao defender a necessidade de recuperar o património imobiliário da cidade e melhorar o estacionamento para os moradores - dois dos aspectos essenciais para uma verdadeira revitalização da cidade. E também ao defender que é urgente «unir» os estigmatizados «bairros periféricos» (p. ex., Chelas e Ameixoeira) de Lisboa à cidade E, de igual modo, a sua posição em relação à CRIL foi bastante lúcida ao defender que a resolução de um problema para Lisboa não deveria ser feito à custa de afectar a área de outro concelho (além da sua defesa na preservação do troço do Aqueduto das Águas Livres que está em risco de demolição).
Por fim, foi bastante assertivo na forma como advogou que a autarquia de Lisboa tem dinheiro para resolver os problemas essenciais do concelho, desde que não caía - como tem caído nos últimos anos - em fazer projectos megalómanos e dispendiosos (vd. Parque Mayer e túnel do Marquês). Mas, de facto, aquilo de que mais gostei foi de ver um candidato com um discurso lúcido e sempre «fugindo» (e ainda bem) das afirmações vazias e ocas de cariz politiqueiro tão em voga neste nosso país.
7/10/2005
In memoriam
Fernando Pereira - fotógrafo «freelancer» português do Greenpeace, morto pelos serviços secretos da França devido à explosão do Rainbow Warrior em 10 de Julho de 1985. Mais informações, aqui.
7/07/2005
O relatório hoje publicado pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais sobre os incêndios florestais ocorridos entre Janeiro e final de Junho mostra valores preocupantes. Em síntese temos o seguinte:
- 2873 incêndios - mais 97,7% do que a média dos últimos seis anos
- 9817 fogachos - mais 78,2% do que a média dos últimos seis anos
- 21.504 hectares de área ardida - o valor mais elevado dos últimos seis anos; mais 36% que a média do período de referência.
Estes valores significam pouco num país que na última década tem ardido uma média de quase 150 mil hectares por ano e que desde 1999 não baixa a fasquia dos 100 mil hectares em qualquer ano.
No entanto, aquilo que os números mostram é um preocupante aumento do número de ocorrência - mais de 12 mil chamadas dos bombeiros; onde estão os efeitos das alterações da lei do ano passado? - que apenas por sorte (e acredito também pela intervenção dos bombeiros) não têm resultado (ainda) em fogos de grandes proporções. Até agora, ainda não se registou qualquer incêndios que superasse os 600 hectares, mas será ingénuo pensar que assim sempre ocorrerá até ao final da época dos fogos...
Uma outra situação que me preocupa, sobretudo em virtude da situação de seca generalizada a todo o país, são os dados actuais do distrito de Viana do Castelo. Este é um distrito que sempre tem ardido pouco (apesar de ter manchas florestais bastante importantes) e que este ano já viu arder 3.164 hectares, quando em todo o ano de 2004 tinha ardido 3.383 hectares.
No ano passado, tivemos a «sorte» de ter chovido nas primeiras semanas de Agosto e também da infeliz «fortuna» de muito já não haver para arder por causa dos fogos de 2003, mas temo que este ano o São Pedro nem outro qualquer santo venha em nosso auxílio.
Continuo, humilde e insistentemente, a defender que enquanto a prevenção e o combate não forem profissionalizados, enquanto não forem ainda mais agravadas as penas para os comportamentos de risco (quer seja incendiarismo quer seja negligência), os incêndios somente pararão quando deixarmos de ter floresta.
7/05/2005
Aparentemente, muito dinheiro está afecto ao ambiente e energia no Programa de Investimentos em Infra-Estruturas Prioritárias apresentado hoje pelo Governo, a saber:
- Reabilitação urbana - 520 milhões de euros
- Resíduos industriais - 150 milhões de euros
- Abastecimento e tratamento de água - 1918 milhões de euros
- Produção de energia eólica - 2530 milhões de euros
Eu já olho para estes valores com alguma bonomia, porquanto investimento para o saneamento básico estou farto de os ver anunciados ao longo dos anos e os rios continuam poluídos e o interior do país a beber água imprópria para consumo. Em relação à reabilitação urbana, enquanto não conhecer em que se vai gastar esse dinheiro, não quero fazer elogios. Se for para projectos do tipo Polis: não, obrigado!
Já em relação à questão da energia eólica, fico assustado. Não que seja contra esta energia - pelo contrário, mas como é anunciada de forma isolada, tenho alguns receios. E isso advém do facto de saber que, grosso modo, um investimento de 2530 milhões de euros dará o equivalente em MW (ou seja, cerca de 2500 MW). Portugal ficaria assim, sem contabilizar outros investimentos na oferta, com um acréscimo de 25% da potência instalada (não necessariamente o mesmo em termos de produção eléctrica). E não foi dito que com este acréscimo fecharão quaisquer centrais de energia fóssil. Ou seja, mais oferta, menos incentivos para a poupança e para a desejada e necessária melhoria da eficiência energética (isto sim, um aspecto fundamental para a economia do país).
Por outro lado, assusta-me fazer uma simples contas e imaginar que cada aerogerador pode ter 2 MW de potência (somente os mais modernos) e que cada parque possa ser constituído por 10 aerogeradores, significa que teremos, no mínimo, 125 parques eólicos espalhados pelo país!!! E sabe-se bem que a maior parte das nossas serras são áreas naturais. E só deveria ser aceitável «sacrificar» aquelas zonas se, em paralelo, houvesse um esforço para a poupança de energia - para a melhoria da eficiência energética. E isso eu não vejo nas medidas do Governo...
O incêndio de ontem em Mafra mostra, curiosamente, a razão de os fogos florestais nas zonas menos densamente povoadas se tornam rapidamente catastróficos. Basta olhar para os meios disponibilizados nete fogo na região da Grande Lisboa: segundo o SNBPC, acorreram 505 bombeiros, 163 veículos, uma máquina de rasto e um meio aéreo. A área ardida foi, ao que tudo indica, de 20 hectares.
Esta noite, por sua vez, continuavam a lavrar dois outros fogos: um em Santa Eufémia, concelho de Seia, onde estavam 48 bombeiros, 11 veículos e quatro meios aéreos; e outro em Ariola, concelho de Meda, que mobilizava 33 bombeiros e 11 veículos. Como são incêndios com várias horas, o saldo já terá atingido algumas dezenas de hectares. Se porventura chegarem a acorrer uma ou duas centenas de bombeiros a um destes incêndios, será mau sinal: significa que tiveram de se mobilizar bombeiros de concelhos longínquos e que, portanto, o incêndio se tornou incontrolável. Pelo que me recordo, em anos anteriores, um incêndio no interior com 200 ou mais bombeiros significou sempre milhares e milhares de hectares ardidos.
Em suma, cada vez se torna mais evidente que o interior necessita de meios suplementares para o combate aos fogos florestais. Mais meios humanos e sobretudo a tempo interior. Ou seja, é necessário profissionalizar os bombeiros do interior.
Nota: Afinal, o incêndio na zona de Mafra foi de 350 hectares (também tinha achado estranho um valor tão baixo em tantas horas de incêndio...). Os 20 hectares - depois corrigidos para oito - eram referidos aquilo que ardeu dentro da área da Tapada de Mafra. Em todo o caso, não retira aquilo que disse no post: um incêndio deste género no interior teria sido ainda mais catastrófico...
7/04/2005
«Não há falta de meios, nem sequer de meios aéreos, o problema é o vento». Esta é a frase do comandante operacional distrital dos bombeiros e da Protecção Civil, Moreira Vicente, para justificar o fogo incontrolável em Mafra que já chegou à Tapada e obrigou ao encerramento da Auto-Estrada A8.
Estas ridículas justificações - já só me falta ouvir que «o problema é o fogo» - mostram bem como os responsáveis pela prevenção e combate aos fogos florestais tentam tirar a água do capote. A culpa não é da floresta mal gerida, não é dos comportamentos de alto risco em tempo quente, não é da deficiente vigilância, não é da inexistência de brigadas de intervenção rápida, não é, enfim, do modo como olhamos para este património económico e ambiental. A culpa essa é sempre do tempo quente... do vento... da falta de chuva... em suma, de Deus que criou os fogos!
Nota: Este foi o artigo final de uma investigação que fiz no Expresso em finais de 2001 que abrangia o mundo empresarial das autarquias e de empresas multimunicipais. Na altura, houve promessas do Governo PS em alterar a lei. Entretanto, em Dezembro desse ano, António Guterres demitir-se-ia e tudo ficou esquecido. Tudo, excepto as empresas que foram crescendo, crescendo... Sócrates bem que podia/devia ser coerente com a promessa de 2001...
«Governo revê Lei», in Expresso, 17 de Novembro de 2001
Luiz Carvalho José Sócrates, ministro que tutela as autarquias, e António Guterres: o Executivo prepara a marcha-atrás |
O secretário de Estado da Administração Local, José Augusto de Carvalho, disse ao EXPRESSO que será «feito um pedido de autorização legislativa com vista ao aperfeiçoamento das normas que evitem a adopção desajustada e sistemática desta organização jurídica». Admitindo que «o Governo tem estado atento aos alertas sobre algumas disfuncionalidades que têm vindo a público», aquele responsável — que no início de Outubro confessava desconhecer a dimensão do mundo empresarial autárquico — defende que a participação de autarquias em empresas deve «ser mais transparente, em especial no que respeita à escolha de parceiros (privados)».
Um outro aspecto que o Governo quer clarificar é a sustentabilidade económico-financeira destas empresas, bem como as formas de financiamento por parte das autarquias. Recorde-se que a esmagadora maioria das empresas municipais com mais de um ano de existência têm reduzida dimensão e apresentam prejuízos. E mesmo aquelas que têm lucros sobrevivem sobretudo à custa de constantes subsídios à exploração ou de contratos-programa, sem os quais entrariam em falência técnica.
Remunerações na ordem do dia
As remunerações são outro aspecto que o Governo quer agora clarificar. Alguns administradores de empresas municipais de pequena dimensão, como acontece no Porto e em Gaia, ganham tanto ou mais que os presidentes das câmaras. E alguns autarcas recebem senhas de presença por estarem à frente de empresas que tutelam.
O líder parlamentar do Partido Socialista, Francisco Assis, diz estar aberto à revisão da lei, mas salienta que esta não «pode ser vista como satanização ou injúria aos avaliados». Assis defende ser «absolutamente inquestionável a necessidade de aperfeiçoar os mecanismos de controlo, segundo os mesmos critérios que são aplicáveis a actividades similares desenvolvidas pela administração central». O chefe da bancada socialista assegura que «o PS contribuirá para que se estabeleça no curtíssimo prazo os mecanismos de controlo de toda a actividade empresarial do poder local».
O Partido Popular (PP) — que em 1998 votou contra a lei das empresas municipais, embora a sua proposta fosse quase idêntica àquela que acabou por ser aprovada — diz que «houve claro exagero na criação de empresas municipais». Basílio Horta, líder parlamentar do PP, critica mesmo o PS pela actual situação «por quando da aprovação da lei de 1998 ter rejeitado um conjunto de regras de gestão e de controlo financeiro que constavam da proposta de lei apresentada pelo próprio Governo». Essa proposta governamental vedava parcerias público-privado, exigia a publicação de estudos de viabilidade económica e previa o controlo da gestão por parte da Inspecção-Geral do Território e Inspecção-Geral das Finanças. Basílio Horta defende que «o universo empresarial deveria ser alvo de uma análise à semelhança da que foi feita por Vital Moreira para os institutos públicos».
Menos críticos são os comunistas. Honório Novo, deputado do PCP, diz que as empresas municipais permitem «uma maior eficiência e operacionalidade num quadro de crescentes constrangimentos legais impostos pela administração central». Contudo, está contra a entrada de privados no capital das empresas municipais e diz que «a sua criação não deve ser uma prática generalizante».
A Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) está, contudo, contra restrições à actual lei. Mário de Almeida, presidente da ANMP e da autarquia de Vila do Conde, afirma que «o actual modelo parece aceitável, merecendo, fruto da sua tenra idade, o teste que só o tempo propiciará». Almeida salienta que o controlo já existe ao nível das assembleias municipais e dos diversos órgãos das empresas (fiscal único e revisor oficial de contas). Defendendo ser «politicamente defensável» a parceria empresarial entre autarquias e privados, o presidente da ANMP acrescenta «não ser legítimo que o Estado queira exercer qualquer controlo de mérito sobre as entidades com participações autárquicas». «Ainda é cedo para fazer qualquer balanço», conclui.
O EXPRESSO tentou obter comentários do PSD, do Bloco de Esquerda e da Presidência da República, mas sem êxito.
7/01/2005
Tendo em conta que o Governo Sócrates anunciou e iniciou uma cruzada para a contenção da despesa pública, julgo oportuno relembrar a criação de um «monstro» empresarial chamado Águas de Portugal, cujos «pais» são exactamente o primeiro-ministro, José Sócrates, então ministro do Ambiente, e o actual ministro das Obras Pública, Mário Lino, então presidente da «holding».
Convém, antes de mais, esclarecer que a empresarialização foi um meio (talvez o único) de começar a resolver o gravissímo problema do saneamento básico do país que à conta das autarquias levava o país a ser, resumidamente, uma imunda lixeira que distribuía à população água cheia de esgotos. No entanto, os meios para chegar a um fim nobre é que são contestáveis. Ao longo dos anos, em vez de se criar uma estrutura que permitisse sinergias e economias de escala, a «holding» Águas de Portugal foi crescendo como um polvo, de modo que hoje temos à «sombra», o seguinte conjunto:
- 18 concessionárias de sistemas multimunicipais de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais (9 são sistemas integrados de água e de saneamento);
- 14 concessionárias de sistemas multimunicipais de tratamento e valorização de RSU;
- 11 concessionárias de sistemas municipais de abastecimento de água e saneamento;
- 9 empresas na área dos resíduos sólidos industriais e fluxos especiais de resíduos;
- 2 empresas com intervenção noutras áreas de negócio;
- 7 empresas nos mercados internacionais
Ou seja, no total, são 63 empresas, cada uma das quais com um conselho de administração constituída por entre 3 e 5 elementos, alguns acumulando cargos em várias empresas. Em muitos casos, também temos autarcas nos conselhos de administração. Em 2001, quando fiz uma investigação para o Expresso sobre o universo empresarial das autarquias foi complicadíssimos saber os dados completos destas empresas - a «holding» recusou mesmo depois de um parecer da CADA -, mas deu para detectar alguns desperdícios (p. ex.,, recordo-me que na SIMRIA havia três administradores para uma dúzia de funcionários). Existem, além disso, situações peculiares e aberrantes (p. ex., parte da água captada pela EPAL é vendida à sua «irmã» Águas do Oeste que, por sua vez, vende ao consumidores). Não estarei a exagerar se disser - tendo em conta que, por exemplo, a administração da EPAL nos custa 5 milhões de euros por ano - que só em administradores, este grupo custa, pelo menos, 200 milhões de euros por ano.
Além disso, é uma «holding» muito sui generis: apesar de ter apresentado um lucro em 2004 de 12,9 milhões de euros - o melhor resultado de sempre - foi feita à «custa» dos lucros da EPAL (26 milhões de euros), o que significa que são os clientes da EPAL que estão a suportar esta «holding» de 67 empresas. Sem a EPAL, a Águas de Portugal apresenta sim um prejuízo de 13,1 milhões de euros.
Eu sei que houve razões politico-autárquicas para esta desmultiplicação de empresas levada ao extremo, mas num período de contenção, talvez fosse razoável pensar numa reformulação desta estrutura, a começar pela supressão de algumas empresas (cuja área de intervenção passaria para outra) e a fusão algumas empresas de base regional, além da integração da componente água-resíduos em algumas regiões.
Pela boca morre o peixe, lá diz o ditado. O rigor que o Banco de Portugal e o Governo quiseram dar ao valor do défice para 2005 virou-se contra eles. Afinal, mais uma «gralha» (daqui a nada temos já um bando digno do filme Hitchcock) que faz com que o défice afinal não seja de 6,83%, mas sim de 6,72%.
António Vitorino, dirigente do PS, diz que não entra na «discussão de uma décima». Mais uma vez, para quem se diz rigoroso, não é uma discussão de uma décima. A dita «gralha» representa um um sobreacréscimo de 1,64% no valor do défice! A título de exemplo, a subida da taxa máxima de IVA (de 19% para 21%) representou um acréscimo de preço de custo de alguns produtos da ordem de 1,68%. Ou seja, com esta sobreavaliação do défoce, afinal parece que não se justificava este aumento do IVA, não é?