7/19/2005

Farpas Verdes CCLVII

Eu não gosto de fazer o papel de «estraga-festas», mas o clima de euforia com que o Governo apresenta o programa de promoção da energia eólica parece-me desmesurado. O primeiro-ministro disse que com isto Portugal reduzirá «a sua excessiva dependência do gás e do petróleo, o que, em consequência, permitirá reduzir as nossas importações e melhorar o nosso equilíbrio macroeconómico».

Sejamos claros: caso o Governo consiga mesmo implantar 2500 MW de eólica, o acréscimo de electricidade por esta via não conseguirá sequer para «tapar» a taxa de crescimento dos consumos por ano. Com efeito, basta fazer o seguinte exercício:

a) em 2004, os 616 MW de eólica produziram 787 GWh de electricidade, ou seja, 1,3 GWh/MW.

Convém, aliás, desmistificar um "pormenor" importante: 1 MW de potência instalada significa diferente «quantidade» de electricidade. Por exemplo, raramente se conseguirá em Portugal que 1 MW de eólica produza mais do que 1,5 GWh. No caso da hidroelectricidade, em ano hidrológico médio, 1 MW produz 3,1 GWh (o ano passado, que teve um coeficiente de hidraulicidade bastante baixo - 0,66 - 1 MW «deu» 2,2 GWh), enquanto 1 MW de térmica atinge mais de 4 GWh (não estou a fazer a apologia de nenhuma, mas somente a fazer alguns considerandos, até porque, tecnicamente, a eólica jamais «substituirá» a térmica, como já referi em anterior post, antes sim pode ser um bom complemento à hídrica).

b) caso até 2010 sejam instalados novos 2500 MW de eólica até 2010 (visão muito optimista), significa que (vamos ser optimistas e assumir que 1 MW produzirá 1,5 GWh), teremos então um acréscimo de produção de 3750 GWh.

c) a evolução do consumo de electricidade em Portugal nos últimos anos tem sido a seguinte:
2001 - 40015 GWh
2002 - 40664 GWh (crescimento de 649 GWh, + 1,6%)
2003 - 43061 GWh (crescimento de 2397 GWh, + 7,2%)
2004 - 45500 GWh (crescimento de 2439 GWh, +5,7%)
isto significa entre 2001 e 2004 (3 anos) que houve um crescimento de 5485 GWh (+13,7%)

d) Conclusão: se em 3 anos aumentámos os consumos eléctricos em 5485 GWh, significa que mesmo sendo optimista - assumindo como refiro em b) que a eólica cresce 3750 GWh em apenas 5 anos -,fácil é de ver que, a manter-se esta taxa de crescimento dos consumos, teremos que aumentar à mesma a importação de carvão e gás natural.

Em suma, se nada se fizer para melhorar a (in)eficiência energética do país - e isso consegue-se crescendo mais e consumindo melhor (e não crescendo pouco e consumindo pior...) -, este programa do Governo nada mais conseguirá que espalhar «ventoinhas» pelas serranias de Portugal, empobrecendo-o ainda mais em termos ambientais e paisagísticos. E, ao contrário do que o primeiro-ministro José Sócrates diz, não «representa um dos pontos de encontro entre a economia e o ambiente», nem «servirá para dinamizar a economia», nem «para dar a Portugal um paradigma de desenvolvimento sustentável e amigo do ambiente».

P.S. Haverei de voltar a abordar, em breve, esta questão sob outra perspectiva (sob a questão ambiental e de planeamento territorial e energético)...

Sem comentários: