1/31/2009
Pormenor importante
Freeport, Google Earth e conservação da Natureza
1/30/2009
E isso também abrange um primeiro-ministro socialista?
1/29/2009
Sofismas e fumaças
Por isso, talvez seja conveniente mais uns esclarecimentos. Primeiro: não houve dois chumbos. A primeira vez que o projecto foi apresentado ao Ministério do Ambiente, em 2000, aquilo que aconteceu foi uma desconformidade administrativa. Ou seja, os elementos constantes do EIA não eram suficientes para uma correcta avaliação. As autoridades ambientais nem sequer disseram que o projecto era bom ou mão; disseram sim que o EIA estava mal feito. E, por isso, mandaram-no para trás, porque nem sequer valeria a pena analisá-lo. Por isso, somente houve o chumbo de Dezembro de 2001.
Ora, esclarecido este «pormenor», vejamos então por que houve algo de estranho entre a reprovação de Dezembro de 2001 e a aprovação em Março de 2002.
Primeiro, quando um projecto sujeito a EIA é chumbado, parte-se sempre do pressuposto que um novo projecto mesmo se no mesmo local tem, necessariamente, de seguir todos os trâmites legais e processuais do anterior, mas como se esse anterior projecto nunca tivesse existido. E isso deve ser feito por uma questão de óbvia prudência reforçada. Um projecto cujo EIA é chumbado numa primeira fase significa que previsivalmente traria, caso fosse implantado, tantos problemas ambientais que não há medidas minimizadoras e/ou compensatórias que lhe pudessem valer. Para quem não anda «nisto», talvez não saiba que a generalidade dos projectos aprovados em sede de avaliação de impacte ambiental tem, em muitos casos, de «abandonar» determinadas componentes ou reformular medidas de minimização, impostas pelas autoridades ambientais. Daí que mesmo os projectos que beneficiam de uma declaração de impacte ambiental favorável, esta é «condicionado» - isto é, os promotores têm a obrigação de aplicar aquilo que o Ministério do Ambiente lhes impõe.
A má vizinhança
1/28/2009
Freeport a grande velocidade
É certo que, em alguns projectos, são estradas, bastante complexos; mas complexo é também aprovar o maior outlet da Europa (é bom destacar isto) numa área parcialmente integrada na Zona de Protecção Especial de Aves (ZPE), numa área sensível do ponto de vista do ordenamento (e isso nem sempre é dito). Não estamos a falar, por exemplo, de um ancoradouro na Aguieira – que, por sinal, teve o seu processo a iniciar mais de cinco meses antes do Freeport e só teve decisão duas semanas depois da aprovação do Freeport.
Aliás, sobre as questões relacionadas com os EIA, infelizmente há quem pense que apenas tratam de olhar para os impactes sobre as plantinhas e os passarinhos – e não há nada mais errado do que isto. Um bom EIA deve ter necessariamente uma boa análise e previsão sócio-económica, verificando mesmo se os pressupostos e previsões do projecto alguma vez se concretizarão (e pelo que se tem visto da evolução do Freeport, como outlet, falhou em toda a escala). Enfim, mas isto fica para próximos desenvolvimentos.
Eis a lista, portanto.
Variante de Loulé à EN270 e Conclusão da Variante à EN396 entre a Zona Industrial de Loulé e a EN270 – Início do processo: 2/8/2001 (5 meses e meio antes do Freeport); Aprovação: 18/3/2003 (quatro dias depois do Freeport)
IC4 - Lagos/Lagoa - Ligação a Lagos – Início do processo: 30/7/2001 (5 meses e meio antes do Freeport); Aprovação: 19/3/2002 (cinco dias depois do Freeport)
Auto-Estrada A7 Sublanço Ribeira da Pena - IP3 – Início do processo: 31/10/2001 (2 meses e meio antes do Freeport); Aprovação: 1//4/2002 (duas semanas depois do Freeport)
Ancoradouro da Aguieira Gafuncho – Mortágua – Início do processo: 25/7/2001 (5 meses e três semanas antes do Freeport); Aprovação: 1//4/2002 (duas semanas depois do Freeport)
Alargamento da Pedreira "Monte da Oliveira" – Início do processo: 5/9/2001 (4 meses e meio antes do Freeport); Aprovação: 4//4/2002 (duas semanas depois do Freeport)
IP5 - Nó do IC2 - Viseu; Sublanços IC2 - Talhadas - Vouzela - Boa Aldeia – Início do processo: 11/8/2001 (5 meses e uma semana antes do Freeport); Aprovação: 24//4/2002 (um mês e uma semana depois do Freeport)
Pedreira do Fojo – Início do processo: 15/11/2001 (2 meses antes do Freeport); Aprovação: 7//5/2002 (1 mês e três semanas depois do Freeport)
Circular Externa da Zona Urbana de Pombal – Início do processo: 17/12/2001 (1 mês antes do Freeport); Aprovação: 9//5/2002 (1 mês e três semanas depois do Freeport)
Projecto de Ampliação do Aeroporto Francisco Sá Carneiro – Início do processo: 26/11/2001 (1 mês e três semanas antes do Freeport); Aprovação: 15//5/2002 (2 meses depois do Freeport)
Parque Eólico de Seixinhos – Início do processo: 10/10/2001 (3 meses e uma semana antes do Freeport); Aprovação: 27//5/2002 (2 meses e duas semanas depois do Freeport)
IC 3 - Variante de Tomar / Nó da Atalaia (IP 6) – Início do processo: 19/11/2001 (2 meses antes do Freeport); Aprovação: 27//5/2002 (4 meses e duas semanas depois do Freeport)
Como o mundo não é só Freeport...
1/27/2009
Freeport - análise comparativa de uma aprovação
De resto, a normalidade processual nota-se na «moda» (do ponto de vista estatístico). De facto, oito dos 15 projectos demoraram entre um e dois anos desde o chumbo inicial até à aprovação de novo EIA. E outros quatro foram aprovados entre três e seis anos após o primeiro chumbo.
Projectos chumbados e depois aprovados (com tempo que decorreu entre chumbo e aprovação)
Outros projectos chumbados pelo Ministério do Ambiente entre 25 de Outubro de 1999 e 6 de Abril de 2002
28 - Centro Integrado de Tratamento e Aterro de Resíduos Industriais (CITRI, Setúbal) - chumbado em 4/12/1999; não voltou a ser analisado.
29 - Aeródromo da Figueira da Foz - chumbado em 31/7/2001; não voltou a ser analisado
Carlyle em apuros
1/26/2009
A investigação jornalística
Vejam as declarações de impacte ambiental
Por isso, saber que justificações (esfarrapadas ou não) se apresentam para passar de um chumbo para uma aprovação pode melhor elucidar que a questão essencial para a mudança de opinião do Ministério do Ambiente foi tão só política (envolvendo tudo o que de bom e mau tem isto) e nada ambiental.
Ainda o Freeport
Destaco, no entanto, estas duas passagens:
«Porque é que o Ministro, neste caso José Sócrates, que tinha delegado as competências para aprovar as DIA no Secretário de Estado, nesta altura Rui Gonçalves, faz uma reunião a pedido da Câmara de Alcochete, com os promotores do projecto, e na qual participa?»
«E é triste ver Rui Gonçalves assumir toda a responsabilidade neste caso, quando eu vi, mas isto fica para outra altura, ser tratado por José Sócrates abaixo de cão, facto que era extensível a todos os seus subordinados que não considerava.»
1/25/2009
O defensor de Sócrates
Ora, quem como eu acompanhou os assuntos do Ministério do Ambiente - e o consulado de Sócrates - desde 1995 (quando ele era ainda um obscuro político), apenas pode esboçar um sorriso. Vale a pena tecer algumas considerações, à laia de nota biográfica, do percurso de Rui Gonçalves e das relações com Sócrates.
Rui Gonçalves foi, durante anos, o mentor de Sócrates nas lides ambientais, como seu chefe de gabinete. Mentor no sentido de lhe ensinar quase o bê-a-bá em matérias ambientais e tinha mesmo um papel de destaque em muitas das iniciativas que Sócrates fez na sua primeira passagem pelo Ministério do Ambiente, ainda como secretário de Estado-adjunto da então ministra do Ambiente, Elisa Ferreira.
Tanto eram unha com carne que Sócrates o haveria de levar para seu chefe de gabinete aquando da sua passagem, a partir de 1997, para ministro-adjunto de Guterres até ao fim da primeira legislatura de Guterres. Depois, no regresso ao Ministério do Ambiente, em 1999, já como ministro, Sócrates promoveu o seu chefe de gabinete a secretário de Estado do Ambiente. Tal como promoveu um outro seu assessor de anos - Pedro Silva Pereira - à outra secretaria de Estado, a do Ordenamento do Território. Rui Gonçalves, durante todos estes anos, foi assim uma espécie de alter ego de Sócrates.
No entanto, algo se terá passado na relação entre os dois, porque aos poucos Rui Gonçalves foi perdendo peso no Ministério e acredito que houve mesmo uma completa perda de confiança por parte do seu ministro. Neste entretanto Pedro Silva Pereira passou a ser o alter ego de Sócrates (dizem que tanto que PSP ganhou os tiques de Sócrates, embora eu ache que foi Sócrates a ganhar os tiques de PSP).
Por tudo isto. aquilo que Rui Gonçalves fazia, nos últimos tempos, estaria a ser controlado por Sócrates. Donde se conclui que a ordem de aprovação da declaração de impacte ambiental de um projecto tão importante como o Freeport - e jamais Sócrates pode dizer que não o era, pois se assim não fosse jamais teria sido aprovado em tempo recorde - nunca poderia ser feita sem conhecimento (e admito que por imposição) de Sócrates.
Certo é que os dois saíram zangados do Ministério do Ambiente, «mau ambiente» que se notou logo pelo simples facto de, ao contrário de Pedro Silva Pereira, Sócrates (já então com grande peso político no PS) não ter incluído Rui Gonçalves nas listas para a Assembleia da República. Entre 2002 e 2005, Rui Gonçalves regressou, como simples técnico para o Instituto do Ambiente, ocupando a quase inexistente direcção de Serviços de Participação do Cidadão.
Com o o regresso do PS ao Governo, e com Sócrates como primeiro-ministro, o seu ex-braço direito foi «reabilitado». Numa linha que eu classificaria como maquiavélica (não menosprezes os teus ex-amigos e confidentes), Rui Gonçalves foi nomeado para secretário de Estado de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas, uma função secundária e para a qual nem tinha perfil. Certo é que, pelo que sei, as relações entre Rui Gonçalves e Jaime Silva, ministro da Agricultura, nunca foram as melhores. E por isso, no ano passado, aproveitou-se uma remodelação ministerial - que nem abrangeu a Agricutura - para «o chutar para cima» (também outro princípio maquiavélico). Assim, Rui Gonçalves foi logo nomeado, em Abril de 2008, para vogal do Conselho de Administração da Empresa Geral do Fomento e, por inerência, assumiu os cargos de presidente do Conselho de Administração da Valnor, da Rebat, da Resat, da Residouro e ainda de vogal da Valorsul, passando ainda a presidir, a partir de Setembro, à Resiestrela (tudo universo de empresas multimunicipais da área do saneamento básico criadas por José Sócrates, quando ministro do Ambiente).
Em suma, Rui Gonçalves passou de «amado» de Sócrates a «mal-amado», mas aquele nunca o deixou cair completamente em desgraça. Veio agora Rui Gonçalves, talvez agradecido, dar o peito às balas por José Sócrates.
Freeport - Texto de análise no Público
O caso Freeport – transformado agora num terramoto político, réplica mais forte de um pequeno abalo em 2005 – tem de ser analisado à luz da época da sua aprovação. Se hoje José Sócrates é primeiro-ministro, no início de 2002 era então ministro do Ambiente e Ordenamento do Território de um Governo cujo partido estava na iminência de perder, como perdeu, as eleições legislativas.
Hoje, um processo de licenciamento similar ao Freeport seria decidido, com igual ou maior celeridade, nos «discretos» gabinetes da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP). Ou seja, era um Projecto de Interesse Nacional (PIN), forma ardilosa para, mais que acelerar procedimentos burocráticos, ultrapassar normas ambientais. Vários projectos, na actual legislatura, foram aprovados neste regime de excepção, quando antes tinham sido reprovados; alguns deles curiosamente pelo ministro do Ambiente do Governo de Guterres. Se nos PIN, agora tão em voga, existem reuniões com ministros e autarquias, com interferência de advogados e familiares de políticos, ficará sempre no segredo dos deuses, até ao momento em que caía uma suspeição similar ao Freeport. Daí que seja perigoso, desaconselhável mesmo até para os governantes, criar regimes de excepção, por maiores que sejam as boas intenções.
Ora, mas no primeiro trimestre de 2002 – o período crucial do caso Freeport – inexistiam regimes de excepção. Aquilo que existia tão-só era um projecto de outlet, abrangendo quase 40 hectares, inserido parcialmente na Zona de Protecção Especial (ZPE) do Estuário do Tejo. Esse projecto já fora, como se sabe, analisado duas vezes pelo Ministério do Ambiente: a primeira em Junho de 2000, sendo devolvido por não cumprir os regulamentos previstos na lei; a segunda, entre Maio e Dezembro de 2001, com «chumbo» ministerial. Até aqui, todo o processo decorreu dentro da normalidade, quer ao nível dos «timings» entre a entrada do estudo de impacte ambiental (EIA) e o início da consulta pública, quer no período de consulta propriamente dita, quer no próprio desfecho («chumbo» por razões ambientais). Aliás, este «chumbo» era expectável. Em Setembro desse ano, no jornal Expresso, o então director da Reserva Natural do Estuário do Tejo, não apenas por causa da ZPE, referia que o próprio PDM de Alcochete nem permitia um projecto daquela natureza.
Por outro lado, aspecto muito relevante, até então o ministério de José Sócrates quase sempre se mostrara irredutível na análise de projectos urbanísticos, comerciais e turísticos em Rede Natura (que incluem as ZPEs). Com excepção do centro de estágios do Sporting (também algo polémico, embora inserindo-se numa zona limítrofe da ZPE do Tejo), Sócrates «chumbara» projectos emblemáticos: um na Lagoa da Vela (apoiado pelo então edil figueirense, Santana Lopes), outro na praia do Meco e um outro na costa alentejana (que veio agora a ser aprovado pelo regime PIN, entretanto suspenso por ordem judicial). Além disso, em 2000, ele exonerara um vice-presidente do Instituto da Conservação da Natureza, José Manuel Marques, por ter licenciado um empreendimento no Abano contra indicações superiores.
É assim neste contexto que a celeridade na aprovação do Freeport deve ser olhada. Não se encontra facilmente um outro projecto que tenha demorado apenas três meses entre a entrada do EIA e um despacho favorável, tanto mais que a alteração do projecto do outlet, em relação ao reprovado em Dezembro de 2001, foi pouco relevante. E mais ainda por se manter o mais grave atropelo à lei dos EIA e às directivas ambientais: a inexistência de alternativas de localização. A modificação dos limites da ZPE – depois revogada, por imposição comunitária – pode ser vista assim como uma tentativa, não inocente, de «branquear» um processo pouco pacífico do ponto de vista legal, mesmo descontando o eventual caso de corrupção e favorecimento. Mas é bom também salientar que episódios como este – aprovação acelerada de projectos polémicos em fim de legislatura – sempre sucederam, como se viu com Cavaco Silva (três projectos no Algarve) e Santana Lopes (Portucale).
1/24/2009
PIN e Freeport
Reflexões sobre o Freeportgate
Fazendo um historial do processo, consultando os dados da Agência Portuguesa de Ambiente, o primeiro estudo de impacte ambiental (EIA) foi apresentado em 10 de Junho de 2000, tendo as autoridades ambientais levado mais de quatro meses (25 de Outubro de 2000) para determinarem que o EIA estava desconforme com as premissas da lei. Ou seja, foi devolvido.
Somente em 22 de Maio de 2001, o EIA do Freeport Leisure - que entretanto substituíra o Grupo McKinney como promotor - dá entrada novamente nas autoridades ambientais. Cerca de três meses depois, em 9 de Agosto de 2001, inicia-se a consulta pública, que decorre até 18 de Setembro de 2001. Note-se - aspecto muito importante -, o tempo médio entre a entrada do EIA e o início da consulta pública é, por regra de cerca de três meses (por vezes mais, muito raramente menos). A consulta pública demora 40 dias, o máximo legal. Ou seja, até aqui tudo normal. Este EIA é, então, objecto de decisão em 6 de Dezembro de 2001: desfavorável, por razões ambientais. Note-se também que este «chumbo» sucede 10 dias antes das eleições autárquicas que levaram à demissão de António Guterres.
Ora, a partir daqui, tudo se altera. Em tempo recorde, o Freeport Leisure reformula o EIA, retirando-lhe apenas o hotel e o health club, e consegue que o processo de avaliação de impacte ambiental se inicie em 18 de Janeiro de 2002. Também em tempo recorde, a consulta pública inicia-se apenas 12 dias depois da entrada do novo EIA nas autoridades ambientais. Não me recordo - e estive a vasculhar muitos prazos de outros processos de avaliação - de outro processo que passou tão rapidamente da entrada do EIA para a fase de consulta pública. O prazo estabelecido, embora dentro da lei, foi encurtado: em vez de 40 dias (como na anterior avaliação do EIA chumbado), este só teve 30 dias.
Terminada a consulta pública em 5 de Março de 2002, a decisão favorável do secretário de estado do Ambiente de então, Rui Gonçalves, é feita em 14 de Março. Ou seja, sete dias úteis depois. Foi rápido, mas não anormalmente rápido, porque em processos não muito complexos, sem grande participação pública, este prazo demora, por regra, menos de um mês (nos mais complexos pode levar vários meses).
Ora, mas a aprovação do EIA no dia 14 de Março de 2002 coincide com a data do Conselho de Ministros que aprova a alteração dos limites da ZPE do estuário do Tejo. E é aqui que está todo o busílis. Mesmo sem conhecer os pressupostos da declaração de impacte ambiental assinada pelo secretário de Estado, certo é que caso a área do Freeport continuasse inserido na ZPE do estuário do Tejo, haveria problemas legais, quer a nível nacional quer comunitário. Com efeito, um projecto daquela natureza numa ZPE exigiria sempre um estudo de alternativas de localização - e o Freeport não teve. Por outro lado, o tipo de ocupação, ainda mais nas margens do estuário, não seria aceitável dentro daquilo que são as premissas da Rede Natura - e a Comissão Europeia certamente interviria, mais ainda por causa da questão ponte Vasco da Gama, que na época ainda estava «quente». Por isso, há uma relação causal directa entre a alteração da ZPE e a aprovação do EIA.
Quanto às relações perigosas entre familiares de José Sócrates, o Ministério do Ambiente e a Freeport, à paragem das investigações durante anos no Tribunal do Montijo e outras coisas esquisitas, é um «caso de polícia».
Mas há apenas um pormenor a reter: José Sócrates, em Março de 2002, nunca imaginaria estar de novo no poder três anos depois... e muito menos como primeiro-ministro. E outra coisa mais: começam a suceder-se demasiados casos no passado de José Sócrates que lhe começam a pesar politicamente. De cor, recordo-me do processo de licenciatura, das ligações também perigosas à construção da estação de compostagem da Cova de Beira, dos seus antigos projectos de arquitectura na zona da Covilhã e agora este caso. Não me recordo de um primeiro-ministro com uma casa que parece ter tanta telha de vidro.
1/23/2009
O lado verde da crise
1/22/2009
Primeiro capítulo
O caso Freeport
Nota: nos meus arquivos, fui desencantar um artigo que fiz no Expresso, em Setembro de 2001, pouco antes de deixar de colaborar naquele jornal. Deixo aqui o texto que então escrevi.
UMA empresa britânica - a Freeport Leisure - pretende instalar um complexo lúdico-comercial em Alcochete, em plena Zona de Protecção Especial (ZPE) de Aves do estuário do Tejo e da Rede Natura, numa área de 37 hectares que coincide, em parte, com a antiga fábrica de pneus da Firestone.
Para uma área de quase 13 hectares está projectada a construção de um centro comercial em modelo «outlet» - espaço aberto -, com 28 salas de cinema, um «health club», uma zona de restaurantes e bares, uma discoteca, um centro de «bowling» e um hotel com 120 camas e centro de congressos.
Contudo, associado ao centro lúdico-comercial, será construído também um parque de estacionamento para cerca de três mil veículos, englobando perto de 11,5 hectares. Além disso, noutra zona adjacente, bastante próxima dos sapais, a Freeport Leisure pretende implantar, em 13 hectares, «um projecto de renaturalização, visando uma qualificação do ponto de vista ambiental».
Estas duas parcelas estão totalmente integradas na ZPE e, segundo a Reserva Natural do Estuário do Tejo (RNET) - a entidade gestora daquela área - estão ainda abrangidas pelo regime da Reserva Ecológica Nacional (REN), que proíbe a ocupação e movimentação de solos. O representante da empresa britânica em Portugal, João Cabral, diz que «o projecto de renaturalização é uma forma de compensar a ocupação da área do estacionamento».
Divergências ambientais
Nessa altura, o então vice-presidente do ICN, José Manuel Marques, referia que «a implementação do projecto (...) não constitui uma incompatibilidade face aos objectivos da conservação da natureza (e da avifauna em particular) e ao quadro normativo e legal que sobre a zona incide». E considerava que seria suficiente a renaturalização da área do antigo pomar para eliminar os efeitos negativos.
No entanto, o plano de gestão, aprovado ainda em 1999, refere que na área da ZPE se deve «manter o carácter rural do espaço» e que «as densidades de povoamento urbano (deverão ser) idênticas ou inferiores às actuais». Isto significa que, quanto muito, se poderia substituir o volume de ocupação da fábrica de pneus por uma área idêntica de uso comercial, mas sem intensificar a presença humana.
Apesar dessa posição inicial do ICN, Antunes Dias, director da RNET,diz que «um parecer daquele género não tem qualquer validade, porque nada pode contrariar a legislação específica de protecção da zona».
O presidente do ICN, Carlos Guerra, afirma que o seu então vice-presidente - que, no ano passado, foi exonerado por José Sócrates por causa do empreendimento do Abano, no Parque Natural de Sintra-Cascais - terá emitido um «parecer voluntarioso». «Não será tido em conta na avaliação do projecto», garante.
Antunes Dias relembra também que a autarquia de Alcochete não pode aprovar nada para aquela zona. Com efeito, a Resolução de Conselho de Ministros de 17 de Julho de 1997 - que aprovou o plano director municipal de Alcochete - excluiu a possibilidade de ocupação da área da antiga fábrica de pneus com actividades de usos urbanos.
De qualquer modo, sob este projecto paira o precedente criado pela aprovação do centro de estágios do Sporting, em Alcochete, que também se encontra na ZPE do estuário do Tejo. Carlos Guerra defende, contudo, que «são processos distintos, porque a ocupação é diferente».