2/10/2009

E por que não?

A atitude de José António Cerejo, do Público, de se constituir no assistente no processo Freeport - facto que nem sequer é inédito - parece-me estar longe de constituir uma violação do código deontológico, ao contrário daquilo que alguns defendem (vd. aqui). Só em teoria, a figura de assistente pode ser vista como um «auxiliar» do Ministério Público - e mesmo se assim fosse não me parece chocante, muito pelo contrário, que um jornalista esteja do lado da procura da verdade (que, salvo melhor opinião, é o objectivo do Ministério Público).

É certo que no Código Deontológico dos Jornalistas se refere que «o jornalista não deve valer-se da sua condição profissional para noticiar assuntos em que tenha interesses», mas não parece que se aplique a este caso. O jornalista José António Cerejo tem tantos «interesses» no apuramento da verdade no caso Freeport como tem qualquer cidadão, incluindo o primeiro-ministro. O que está em causa, neste trecho do Código Deontológico, são apenas os «interesses» particulares - ou seja, o jornalista apenas deve prescindir de noticiar sobre assuntos que o beneficiem em sentido estrito, e não como membro integrante de uma sociedade. Se assim não fosse, imaginemos que um jornalista não poderia noticiar, por exemplo e por absurdo, críticas sobre o aumento do preço da gasolina, porquanto como cidadão lhe interessa que a gasolina não aumente.

Além disso, José António Cerejo - ou qualquer outro jornalista que proceda do mesmo modo - não acede ao estatuto de assistente no processo através de qualquer combinação com terceiros que o possa comprometer (como sucedeu, por exemplo, com os jornalistas que participaram em assembleias gerais de bancos), pelo que a sua independência está garantida neste aspecto.

Por fim, a solução de assistente acaba por ser até uma forma de cumprir o Código Deontológico, pois aí se refere que «o jornalista deve lutar contra as restrições no acesso às fontes de informação e as tentativas de limitar a liberdade de expressão e o direito de informar«. Ora, ter acesso à informação por via de ser asistente parace-me ser mais correcto, do ponto de vista deontológico, do que contribuir para uma violação do segredo de justiça. E mesmo se este expediente (constituir-se assistente) fosse desleal - o que nem é o caso, na minha opinião - sempre se deveria aprová-lo porque a procura da verdade surge aqui acompanhada por «razões de incontestável interesse público», algo que acaba por ser aceite pelo Código Deontológico.

Nota 1: Como talvez alguns saibam, pertenci ao Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas para o biénio 2007-09, mas demiti-me em Julho do ano passado. Portanto, esta é uma opinião pessoal e que vale aqui que vale.

Nota 2: Subscrevo inteiramente esta opinião de Manuel António Pina. Por razões que deveriam ser óbvias, menos para alguns.

2 comentários:

Manuel Brás disse...

I Acto

O milagre “socialista”
feito de pura fantasia,
baseia-se numa doutrina moralista
que derrama hipocrisia!

O mexilhão que se esforça,
aguentando muitas agruras,
não pode partir a loiça,
sujeitando-se a estas torturas!

II Acto

Com a crise para durar,
como o tal boneco das pilhas,
poucos parecem confiar
nestas políticas de pacotilhas.

Os mexilhões endurecidos
pelo mar inconstante,
já não dão ouvidos
a este (des)Governo desconcertante!

III Acto

A verdade é um bem escasso
nestes “socialistas” manhosos,
tamanho tem sido o amasso
com (des)governantes fantasiosos.

O mexilhão amassado
por tanta política incongruente,
está completamente desgraçado
e moralmente descrente!

Epílogo

Num país de faz de conta,
com muitos séculos dessa história,
neste vinte e um que desponta
tem emergido muita escória.

Muita coisa acontece,
e muita irá acontecer,
a democracia desmerece
por tanta conta fazer.

O mexilhão já lixado,
mais lixado ficará,
triste é o seu fado
e mais triste ficará!

Teresa disse...

A minha dúvida é se, sendo assistente no processo, estará a aceder à informação ou a prejudicá-la. Sendo parte no processo tem acesso a ele mas está obrigado ao segredo de justiça enquanto se verificar.
António Cerejo vai continuar a escrever sobre o Freeport violando a lei ou vai ser um cavalo de Tróia e passar a informação aos colegas?