3/07/2005

À Margem Ambiental XLVI

A propósito ainda do artigo de opinião do indigitado ministro das Finanças, transcrito em parte no post anterior, gostava de acrescentar alguns considerandos.

A sugestão - que espero que venha a ser aplicada - de se vir a taxar a propriedade rural em meio cêntimo por metro quadrado - o que dá 50 euros por hectares, ou seja, 10 contos na moeda antiga, um valor que até acho modesto - é uma medida essencial para aumentar a produtividade. Só aparentemente é uma medida anti-social. De facto, é tempo de sermos um país em que a norma é coleccionar terrenos, mesmo que improdutivos. O flagelo da nossa floresta e da nossa agricultura tem muito a ver com esta questão. A terra, em muitas regiões do país, é deixada ao abandono, porque nada se perde, mesmo que nada se ganhe.

Trabalhamos, em certa medida, para obter receitas porque necessitamos de cobrir despesas. Ora, o solo rural é um bem demasiado precioso e raro para estar estagnado. Para «obrigar» os proprietários a rentabilizá-lo há que lhe impor um custo. Dir-me-ão que esse imposto acarretaria que alguns pobres proprietários não tivessem capacidades para os manter. Pois bem, das duas uma: se não conseguem tornar esse solo minimamente rentável (e essa rentabilidade é assegurada se der por ano o tal meio cêntimo por metro quadrado), então que o vendam. Haveria, aliás, com essa medida um aumento da oferta de terrenos - baixando, portanto, os valores -, que seriam comprados por quem teria a capacidade de inovação e a ousadia de os tentar rentabilizar. Se isto resultar numa situação em que apenas os ricos tenham a posse da terra, digo que prefiro isso à situação actual, em que todos (pobres e ricos) democraticamente são detentores de terras, mas a produtividade é baixa.

Além disso, o Estado e as autarquias conseguiriam, desta forma, uma fonte de receitas bastante atractiva (qualquer coisa, em números redondos de 450 milhões de euros por ano, incluindo a área urbana, que deveria ser taxada em valores distintos), podendo, em certa medida, contribuir para encontrar uma alternativa à perniciosa dependência dos «impostos do betão» que é a desgraça do nosso urbanismo.

Por outro lado, parte destas verbas poderiam contribuir para a velha questão da justa comparticipação que os proprietários florestais deveriam dar para a prevenção e combate aos fogos florestais. Aliás, sobre esta matéria, no livro «O Estrago da Nação» tinha feito uma proposta que, em certa medida, é similar aquela que Luís Campos e Cunha propõe. Deixo-a aqui em baixo.


«Se o Estado não se demitisse de obrigar os proprietários florestais a assumirem as suas justas responsabilidades no apoio à prevenção e combate dos fogos, haveria dinheiro suficiente. Mas, como se sabe, a contribuição financeira dos proprietários das florestas é irrisória. Tal como acontece com a contribuição autárquica nos prédios urbanos, o valor patrimonial dos prédios rústicos estagnou, em muitos casos desde há décadas. Mas se no caso da habitação as autarquias têm contornado essa situação promovendo – com os efeitos conhecidos – a construção de habitação nova que apresenta um valor patrimonial muitíssimo superior, no caso dos terrenos florestais não há volta a dar-se. Apenas com uma reavaliação dos valores patrimoniais, algo que implicaria uma autêntica revolução, este estado de coisas mudaria.

Com efeito, em muitos casos, a contribuição autárquica dos chamados prédios rústicos, sobretudo florestais, é completamente irrisória, chegando a atingir valores de cêntimos de euro por cada hectare, que na prática nem são cobrados. E também aqui o absentismo não é penalizado. Ora, uma actualização gradual do valor patrimonial – e, portanto, dos montantes da contribuição autárquica – permitiria aumentar as receitas do Estado e das autarquias, desde que isso fosse acompanhado de um fundo especial a criar para a promoção da gestão florestal.

Obviamente que essas verbas não poderiam, assim, ser encaminhadas para o bolo global do Orçamento Geral do Estado. Para avaliar o impacte económico desta medida fiscal, basta verificar que, se por exemplo os proprietários florestais passassem a pagar uma taxa anual de 25 euros por hectare conseguir-se-ia obter, para a totalidade da área florestal do país, um montante da ordem dos 75 milhões de euros. Ou seja, três vezes a verba anualmente gasta no combate aos fogos florestais. Mesmo que se quisesse ser mais condescendente, aplicando-se uma taxa anual de cinco euros por hectare, a verba total daria para cobrir os custos da prevenção.

Não tendo coragem política para estas mudanças, ignorando os problemas estruturais, e apesar da calamidade dos incêndios, os sucessivos governos continuam impavidamente a bater na mesma tecla, apostando sobretudo no combate aos incêndios. Tem sido dinheiro que arde com as florestas, já que não existe qualquer relação entre o dinheiro disponibilizado para o combate e a área ardida.»

Sem comentários: