Farpas Verdes XI
Em quase uma década de jornalismo, fui-me habituando, com naturalidade, a ser visto como persona non grata para os lados da Rua do Século. Sei que não tenho bons fígados, mas não é por esses motivos que tenho esse estatuto. Tenho como virtude para muitos e defeito para muitos outros (ainda não pretendi fazer um balanço... talvez numa próxima sondagem) de denunciar casos comprometedores para políticos, autarcas e outras entidades e pessoas que, por diversas razões, acções e inacções, muito têm contribuido para o Estrago da Nação (não o blog, nem o livro... se bem que sem eles o livro não teria razão de existir nos termos em que foi escrito).
Vem isto a propósito de ter revivido hoje uma situação que era quase semanal nos tempos em que escrevia no Expresso: para os lados da Rua do Século, qualquer que fosse o Governo, qualquer que fosse o ministro, as portas quase smpre se fechavam para fazer declarações. Mais ainda após uma notícia de que não gostavam...
Estando a regressar aos pouco de uma espécie de retiro (meio voluntário, meio involuntário) na minha actividade jornalística, vejo-me numa espécie de deja vu. Ontem no Diário de Notícias escrevi que os próprios boletins hidrológicos semanais de Espanha revelavam a ausência de caudais à entrada dos rios Tejo e Guadiana. Num passado muito recente e, também, sistematicamente desde 2000. Já agora quem quiser confirmar que em 19 de Janeiro deste ano a estação de Alcântara no rio Tejo tinha caudal zero, basta clicar aqui.
Como é habitual num diário, após a saída da primeira notícia, o editor do DN pediu-me que obtivesse reacções políticas do assunto para fazer aquilo que se chama um follow-up. Assim fiz, assim telefonei várias vezes para o Ministério do Ambiente, assim obtive da assessoria de imprensa promessas de resposta. A manhã passou, a tarde também estava a ir, e de facto já se fazia tarde. Estava a ver que o silêncio jogava a favor de quem não queria falar, o que é um dos piores defeitos do poder numa democracia (revela cobardia ou prepotência ou ignorância ou desresponsabilização ou tudo isto junto).
Mas eu não gosto de esperar sem nada fazer. Assim, enquanto aguradava por quem afinal nada disse, decidi dar uma volta por vários sítios da Internet, mais propriamente pela página do Instituto da Água. E, nem de propósito, obtive uma nova notícia relacionada com o tema em qustão: desde 1 de Outubro até à data em 48 dias completos, Portugal tinha inactiva a recolha de dados hidrológicos da estação de Monte da Vinha, junto à fronteira espanhola do Guadiana. Sem isso é impossível saber em tempo útil aquilo que Espanha deixa ou não passar. Sem isso não foi possível detectar que, por exemplo, em 29 de Dezembro do ano passado o rio Guadiana estava com caudal nulo, conforme o próprio boletim hidrológico de Espanha revelava.
Por isso, obrigado ao Ministério do Ambiente por terem permitido aguçar o meu espírito de pesquisa. Sem o silêncio deles, talvez não andasse a procurar mais informações e não teria descoberto aquilo que descobri. Por mais que insista, nunca consegui convencer quem não deseja prestar-me declarações (não é por mim, é pelos leitores e pelos cidadãos do país, que têm o direito de saber e eles o dever de falar) que o silêncio nunca me fez deixar de escrever uma notícia. Pelo contrário; muito pelo contrário...
P.S. Mas não tenho ressentimentos. Quando necessitar de novos comentários do Ministério do Ambiente, lá estarei a ligar-lhe à Rua do Século para os pedir. Uma, duas ou mais vezes.
1/27/2004
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