5/04/2005

Farpas Verdes CCIX

A pretexto de uma discussão na Ambio, escrevi um texto com uma rápida análise da situação do movimento ambientalista e dos seus dirigentes. Deixo-o aqui, como o escrevi (amanhã se vir erros, corrijo...).


Uma ONG tem, no seu âmago, um funcionamento muito semelhante a um partido político em relação aos objectivos das pessoas que a integram. Tal como nos partidos políticos existem pessoas com verdadeira vontade de serviço público e exercem-no sem pedir nada em troca, nas ONG também. Não vale a pena aqui discutir se a percentagem de pessoas (dirigentes e «bases» nas ONG que têm um objectivo somente nobre é superior ao do que se verifica nos partidos políticos. Mesmo que exista uma maior percentagem (pessoalmente penso que sim), é exactamente a dimensão das ONG que as torna apetecíveis aos ambiciosos.

Ou seja, é mais fácil singrar no movimento ambientalista do que num partido político; ter mesmo visibilidade pública. Falo por mim: tinha acabado a licenciatura em 1993 e era já dirigente nacional da Quercus (se me perguntarem se fiz um bom trabalho, responderei que sim; se me perguntarem se isso é sinal de maturidade minha ou imaturidade da ONG, porque não teve capacidades de atrair pessoas com mais experiência, escolherei de caras a segunda alternativa).

Ser dirigente de uma associação importante como a Quercus ou a LPN ou o GEOTA permite, de facto, subir um patamar de forma rápida. Depende depois de cada pessoa como faz a gestão desa subida. Não sou absolutamente nada contra antigos dirigentes de associações ocuparem cargos políticos ou de confiança política. A questão preocupante é saber se essas nomeações foram feitas pelas suas capacidades técnicas ou se pelos «fretes» que fizeram enquanto dirigentes. Isto é, a eventual mácula não advém da aceitação do cargo, mas sim da justificação para a escolha do cargo.

Em todo o caso, sou liminarmente contra que um dirigente ambientalista salte para uma empresa privada, abordando questões que meses antes tratou como dirigente da ONG.

Por outro lado, é sempre prudente ter o chamado «período de nojo», ou seja,evitar saídas repentinas das ONG para ocupar cargos políticos. Por exemplo, eu evitaria a alternância que o José Alho tem tido - Quercus, IPAMB, PNSAC, LPN, candidato à autarquia de Ourém -, embora não a censure de todo (talvez por ser seu amigo), porque penso que em qualquer dos sítios onde esteve fez alcançou o cargo por mérito e fez um trabalho globalmente positivo. Esta questão é sensível e não apenas nas ONG. É, por exemplo, uma das questões éticas mais discutidas no seio dos jornalistas (devido à passagem para assessorias de gabinetes ministeriais, para empresas de comunicação e sucessivo regresso à actividade jornalística).

Por fim, uma última nota: o movimento ambientalista tem feito, sem dúvida,um trabalho extremamente positivo para o qual, infelizmente, a sociedade ainda não prestou o devido tributo - se assim fosse tinhamos, pelo menos, muitos mais associados. No entanto, a sua pequenez é uma das suas maiores fragilidades. Quando sabemos que basta uma camioneta para conseguir eleger uma direcção da Quercus, o risco é enorme. E, por isso, convinha ao movimento ambientalista português congregar-se, fundir-se, e criar uma federação (não a CPADA, que tem actividade muito limitada) que fosse assente na profissionalização e tivesse acima de tudo uma boa capacidade financeira e técnica (e já agora uns estatutos blindados e um código de ética).

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