2/03/2005

Farpas Verdes CLII

Na segunda-feira passada, no jornal Público surgia uma notícia em que o presidente da autarquia de Aljezur se insurgia contra o facto de se ter autorizado o corte raso de uma área florestal em zona de Reserva Ecológica Nacional, «deixando montes e vales nus, expostos à erosão». E rematava: «O regime da REN constitui o maior atentado ecológico deste concelho».

Compreendo a posição deste autarca - que aliás parece-me ter uma posição de alguma sensatez e pertinência nos argumentos que usa -, pois a dualidade de critérios com que o regime da REN é a causa para os sucessivos ataques a este instrumento de planeamento e de defesa do ambiente.

Existe, de facto, algum radicalismo em algumas situações e, por outro lado, algumas cedências incompreensíveis ao regime da REN que fazem com que haja legitimamente uma sensaçao de injustiça. No caso em apreço, a Direcção Geral dos Recursos Florestais deveria ter condicionado o corte raso ou exigido medidas de minimização, porque de facto se o solo ficar nu aumentam os riscos de erosão e o objectivo da classificação daquela área é inconsequente.

Gostaria também de tecer algumas considerações sobre um crónico exemplo que repetidamente é referido pelos autarcas: a bendita casa de banho que não pode ser construída numa casa por estar dentro de REN.

Não sejamos ingénuos. A casa de banho tem apenas um sentido figurativo e, na realidade, o problema é complexo e tem um efeito mais abrangente. Se hoje fosse a casa de banho, amanhã seria o quarto do filho, a sala para as visitas e por ai fora. Tenho plena consciência que, em alguma zonas, poder-se-ia «sacrificar» áreas de REN, se houvessem salvaguardas bem regulamentadas.

Por exemplo, admitiria - como chegou a ser usado informalmente em algumas comissões de REN - um acrescento de uma habitação se pudesse fazer até uma percentagem da área original. Recordo-me que o usualmente aplicado era de 20%. Contudo, deveria ser obrigatório que essa habitação não pudesse ser vendida por um prazo de, pelo menos, 10 anos para evitar que se fizesse negócio com esta cedência.

Por outro lado, é bom recordar que ao evitar-se construção em áreas de REN é também uma medida de ordenamento e de economia. A dispersão habitacional acarreta - em muitos casos - um acréscimo dos custos de saneamento básico (pagos por todos). Dessa forma, deveria ser liminarmente proibido construções de habitações em áreas de REN onde nada existisse. No caso de equipamentos de apoio à agricultura, admito que se pudesse sacrificar áreas de REN, mas em casos especiais e convenientemente regulamentados. No entanto, as sanções pelo desrespeito do uso deveriam ser bastante pesadas.

No entanto, quero frisar que mesmo a actual lei da REN tem mecanismos de excepção que permitem ao Governo desanexar áreas por razões de economia regional e local. O grande problema é que quase nunca as desanexações que se pretendem têm essa bondade. São tão-somente um ardiloso esquema de construir em apetecíveis áreas naturais - vd. investimentos turísticos - com preços dos terrenos bastante baratos. E baratos porquê: exactamente porque os anteriores proprietários não poderiam lá construir. Por isso, digo: no dia em que modificarem as áreas da REN ou mutilarem os seus pressupostos haverá muita gente a enriquecer. A manutenção da REN é, por isso, também uma questão de elementar justiça.



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