8/18/2006

Isto não é ser profeta, é conhecer os políticos

Ouvindo os ministros da Administração Interna, da Agricultura e até da Presidência tecerem loas às maravilhas que se estão a conseguir com a alegada redução da área ardida - somente não se juntou ainda o ministro do Ambiente, talvez por escrúpulos -, não resisto a colocar aqui uma pequena passagem do meu livro «Portugal: O Vermelho e o Negro» (vd. pg. 103-104):

Lamentavelmente, os piores anos de incêndios acabam, a prazo, por ser «benéficos» para os políticos, uma vez que servem na perfeição para subir o conceito de «ano catastrófico». Veja-se o caso de 2004: apesar de ter chovido bastante em Agosto, mesmo assim ardeu quase 130 mil hectares. Esse valor seria considerado catastrófico nos anos 70 e 80, mas perdeu «relevância» na presente década por causa dos trágicos números de 2003. O mesmo se aplica ao ano de 2005, que tendo sido também devastador, ficou 100 mil hectares abaixo dos valores de 2003. Os últimos anos têm mesmo modificado a percepção nacional sobre o grau de destruição. Se nas décadas de 80 e 90, um ano que rondasse 100 mil hectares queimados era tido como péssimo; agora seria um valor considerado excelente. Se num próximo ano se se regressar à casa da centena de milhares de hectares, os governantes terão a desfaçatez de vincar a «excelência» das medidas de prevenção e a eficácia do combate. Mesmo que tenha chovido a cântaros durante todo o Verão. A partir de agora para um ano ser publicamente calamitoso «necessita» que arda mais de 425 mil hectares. E, claro, se tal acontecer, a culpa será sempre do tempo quente e seco, como o senso comum dos portugueses «compreenderá» e a falta de memória auxiliará.

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