2/09/2004

Farpas Verdes XXII

Hoje o Presidente da República encontra-se no Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros e o tema a abordar é as energias renováveis. Nem por acaso, na edição do Público surge a notícia de que Portugal terá de construir um parque eólico por semana para atingir as metas comunitárias de 39% de produção de electricidade por via de energias renováveis. Esta notícia mostra claramente uma pressão para que os projectos de energias eólicas sejam aprovados com celeridade; e é verdade que a Administração Pública é, neste asunto como noutros, de uma lentidão exasperante.

Mas o que esta notícia e o local escolhido pelo Presidente da República (uma área protegida) mostram é que às tantas se pode "semear" aerogeradores em tudo o que é montanha e, como se sabe, grande parte dos locais mais atractivos são zonas sensíveis.

Sou, por natureza, favorável às energias renováveis, mas sou ainda mais à preservação de áreas protegidas, e ainda mais à poupança de energia e também às análises numéricas. Fui, por isso, verificar se estamos ou não, nos dias de hoje, longe da tal meta dos 39% de produção de electricidade por via das renováveis. Por exemplo, no ano passado, as barargens hidroeléctricas produziram 14.669 GWh, as mini-hídricas 1.026 GWh e as outras renováveis 466 GWh, para uma produção total de 43.074 GWh (confirmar valores aqui). Ora isto dá 37,5% de produção eléctrica de energias renováveis, ou seja, muito próximo da meta comunitária. Claro está que o ano de 2003 foi bastante favorável em termos hídricos (um coeficiente de hidraulicidade 34% acima da média). No caso do ano 2002, as energias renováveis apenas atingiram 20,4% do total.

Mas o grande problema não está nesta variação, mas sim no forte crescimento da produção (e consumo de electricidade). Entre 1999 e 2003, a produção eléctrica do país cresceu uns impressionantes 20,3%. Ou seja, a questão não deve estar somente inserida na parte da oferta, mas sobretudo na procura; ou melhor, na forma como se desperdiça electricidade. Ainda se admitiria que houvesse crescimentos desta ordem de grandeza na produção eléctrica se o PIB tivesse registado um incremento similar; mas não teve, longe disso.

Portanto, receio que se houver agora esta euforia em relação às energias eólicas, sem cuidar do resto, que é o essencial, poderemos um dia acordar com as nossas montanhas e áreas protegidas cheias de aerogeradores, continuando sem cumprir as metas comunitárias.

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