Farpas Verdes XXXII
No jornal Público de hoje, são apresentados os resultados das acções da Inspecção-Geral do Ambiente (IGA) em matéria de poluição do ar. Apenas por a situação ser grave evita que se reaja com uma sonora gargalhada ao método usado pelo Ministério do Ambiente para inspeccionar as empresas. Como já havia sido noticiado há cerca de um ano, a IGA não possuindo meios técnicos e humanos - ou melhor, os sucessivos Governos intencionalmente não os têm fornecido -, optou por endereçar notificações às empresas para que estas lhe enviassem os auto-controlos, obrigatórios por lei. É perante as respostas que a IGA veio agora apresentar resultados.
Segundo o Ricardo Garcia, jornalista do Público, "os resultados são decepcionantes e revelam que, em grande medida, a lei é ignorada. Apenas um por cento das indústrias (33) revelaram cumprir escrupulosamente o que está previsto na legislação. Outros cinco por cento (145) até faziam o autocontrolo, mas ou apresentavam apenas uma medição, em vez de duas, ou os resultados mostravam que a poluição era superior à permitida.
Um terço das indústrias (32 por cento) nem sequer respondeu à notificação. E, entre as que responderam, a maior parte não enviou quaisquer análises (25 por cento do total) ou argumentou que não tinha fontes fixas de poluição (36 por cento). O relatório da IGA salienta que muitas empresas 'afirmam total desconhecimento da legislação em vigor'.
Se se levar em conta apenas as indústrias com fontes fixas de poluição declaradas, o balanço mantém-se claramente negativo. Quatro em cada cinco (80 por cento) não fizeram qualquer autocontrolo, 16 por cento apresentaram resultados insatisfatórios e apenas 4 por cento estavam dentro da lei".
Antes de mais há que fazer aqui um ponto prévio. Este tipo de intervenções não podem ser denominadas de "inspecção"; antes sim de fiscalização. Uma inspecção, por definição, implica a visita presencial às empresas e a análise in loco pela própria entidade inspectora, ou seja, a IGA. Aquilo que a IGA fez através de correio é apenas uma pequena avaliação (pouco técnica e nada científica) do eventual cumprimento da obrigatoriedade das empresas fazerem auto-controlo.
Por outro lado, o anúncio de que apenas as empresas que não enviaram dados - ou por não terem respondido ou por assumirem não possuir fontes de emissão - estão a ser alvo de verdadeiras inspecções é um erro crasso. Mesmo aquelas que enviaram dados deveriam ser inspeccionadas, sob o risco de assim, nos próximos anos, se enviarem dados errados para evitar a visita da IGA.
O país está sendo envenenado por fábricas e fabriquetas. Mesmo com poucas inspecções - ou sobretudo por isso - nota-se que a percentagem de infracções é elevadíssima (das 7,5% das empresas que estão na lista de "inspeccionáveis", 70% foram entretanto autuadas por infracções, segundo revela o Público) e assim continuará se não existir uma inversão no desinvestimento nesta matéria. Enquanto o Estado pensar que está a fazer um favor ás empresas e à economia por não as inspeccionar em termos ambientais, continuaremos sem uma indústria competitiva e sem bom ambiente.
Por fim, a avaliação que o inspector-geral do Ambiente, Filipe Baptista, faz destas acções - de que "isto é uma forma de empurrar as empresas para o cumprimento da legislação" e de que "há muitas empresas que não sentiam a fiscalização, e agora sentem" - só pode ser uma brincadeira. O inspector-geral até pode ter muito boas intenções, mas se eu fosse um empresário sem escrúpulos facilmente contornaria este esquema e se fosse um empresário com escrúpulos (e portanto cumpridor) estaria irritado com esta brandura e candura do Ministério do Ambiente perante os meus competidores.
2/16/2004
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